A quinta-feira, 11 de setembro, estava quente que só. E seca. De repente, por volta das 17 horas, alguém virou o seletor do clima, a temperatura despencou 12 graus e um vento frio começou a soprar. Ficou, então, com mais cara de inverno, um cair da noite propício para uma boa sopa — nada melhor que em torno dela, bons amigos; como diz a poesia da canção de Nilson Ribas “com bons amigos ao nosso redor a vida é sempre melhor”. Quem não se encarangou e apesar da súbita virada encarou ir ao SESC de Osasco curtir mais uma apresentação do projeto “Caldos com Sons Brasileiros” pode comprovar o quanto é verdadeira a letra da música “Bons Amigos” e, além da tigela caprichadinha de canja, sentiu todo o calor que tomou conta do Deck da Cafeteria durante a apresentação de Cláudio Lacerda com uma boa pitada de intimismo, mas com toda as evocações possíveis de pairar no ar motivadas por uma roda de violão acompanhada de uma viola bem temperadinha, nas mãos, respectivamente de Lacerda e Daniel Franciscão.
Os moços estavam inspirados e abençoados e o Cláudio Lacerda até contou causos, além de conversar animadamente com os fãs. Começa que logo de saída ele, ainda sozinho no palco, deu início à cantoria com “Olhos Profundos”, de Renato Teixeira, parceiro em várias canções dos álbuns “Alma Lavada” (2003), “Alma Caipira” (2007) e “Cantador” (2010). O autor de “Romaria” também foi lembrado com “Frete”, o tema da série “Carga Pesada”. Sucessos do nosso cancioneiro, composições com outros companheiros do estradar ou interpretadas por Cláudio Lacerda em sua discografia também fizeram parte do apurado repertório tais quais “Dia de Apartação” (dele e de Adriano Rosa); “Rede de Taboa” e “Você vai (Elpídio dos Santos); “Tempos atrás” (Sérgio Penna, do Violeiros Matutos); “Cumpadi” e “Quiero“ (Zé Paulo Medeiros); “Bons Amigos” (Nilson Ribas); “Mourão de cerca” (José Maria Giroldo), “Casa no campo” (Zé Rodrix) ( “Disparada” (Geraldo Vandré e Théo de Barros, consagrada por Jair Rodrigues em 1966); “Canto Brasileiro” (parceria com Edu Santhana, um hino sobre os vários tipos brasileiros); “Canta que é bonito” (com Júlio Bellodi). “Canta, Moçada” (Tinoco e Nonô Basílio) foi a música escolhida para o bis — cujo refrão, aliás, ganhou novos versos entoados pela plateia que não queria que as atrações fossem embora: “canta moçada, até de madrugada, canta moçada, até de madrugada”.
Daniel Franciscão
O violeiro Daniel Franciscão é autor de “Violeiro de Profissão”, lançado no segundo semestre de 2013, primeiro álbum da carreira. Franciscão (que Cláudio Lacerda apresentou como “o moço dos dedos ágeis”) também é fundador, regente e diretor musical da Orquestra de Violeiros Terra da Uva, de Jundiaí . O disco tem 13 faixas, duas com as participações de Cláudio Lacerda.
“Violeiro de Profissão” é uma mistura de muito bom gosto de sons brasileiros e andinos, passeando por ritmos como baião, chamamé e toadas entre outras muitas influências que tornam a obra diversa e sem fronteiras. O universo das 10 cordas da viola caipira está muito bem representado, traduzindo as plurais linguagens do instrumento em canções de identidade singular. Elas evocam e trazem para o ouvinte mensagens de simplicidade, admiração à natureza e amor à profissão de cantador e de violeiro.
Discografia de Cláudio Lacerda
“Alma Lavada”, de 2003, “Alma Caipira”, de 2007 e “Cantador”, de 2010 são os discos lançados por Cláudio Lacerda, por três vezes consecutivas agraciado pelo Instituto Brasileiro de Viola Caipira, promotor das respectivas edições do Prêmio Rozini de Excelência de Viola Caipira (2005, 2010 e 2013). A discografia e as láureas deste filho de mineiros comprovam que ele, de fato, traz no peito raízes estreitas com a música regional, elo que se estreitou com a graduação em Zootecnia na cidade de Botucatu, encravada na região onde se localiza um dos berços da cultura caipira paulista. Botucatu, basta lembrar, é terra lavrada por Angelino de Oliveira, que lá viveu e constituiu família, legando para a cultura nacional a legendária “Tristeza do Jeca”, e onde frutificou outra expressiva voz do universo de raiz, Osni Ribeiro, outro com quem Lacerda articula tabelinhas perfeitas.
Então guelém, guelém vai ouvindo, vai ouvindo e saiba que até os “gringos” da famosa revista “Rolling Stones” já elogiaram bastante as composições de Cláudio Lacerda. No mesmo diapasão. soaram as críticas elogiosas de veículos como o “Estado de São Paulo”, “Estado de Minas” e “Correio Braziliense”, jornais de expressão nacional e de público eclético. Em breve, público e mídia terão nova oportunidade de ouvi-lo em álbum novo, se possível atendendo à dica de Aquiles Riques Reis, músico e vocalista do MPB4, que sugere “deixar o tempo de lado, ao menos por alguns minutos” na hora de rodar na vitrola as obras lacerdianas, sua voz forte e marcante, o seu macio toque nas cordas.