
Rodrigo Zanc, Ricieri Nascimento (baixo), Wilson Teixeira, Cláudio Lacerda, Luiz Salgado e Bruno Bernini (bateria): encontro de alegria e amizades no palco e no hall de acesso ao teatro do Sesc Santo Amaro (Fotos: Marcelino Lima/Barulho d’água Música/Acervo Projeto Cultural 4 Cantos®
Gente chegou lá de trem, pegou Metrô, encarou ônibus, foi de carro e até fez sacrifício para, mesmo apoiada por muletas, não perder a chance. Eram pessoas de cidades por onde os músicos já haviam passado e deixado saudades tais quais Araraquara, Avaré, São Carlos, Americana, Piracicaba, São José dos Campos, Osasco ou parceiros de estrada como Noel Andrade, Julio Bellodi e Sarah Abreu, misturados a quem ainda não os tinha visto no palco. Agora, quem já está com saudades e perguntando “quando é que eles voltam?” é boa parte do público paulistano que teve a oportunidade de curtir, em duas apresentações, em unidades do Sesc, o projeto cultural 4 Cantos. Primeiro no bairro de Campo Limpo, apesar da noite fria e chuvosa. Era 4 de julho, data da estreia em Sampa, depois de quatro anos de estrada. Em seguida, no dia 11 de julho, quando Cláudio Lacerda, Luiz Salgado, Rodrigo Zanc e Wilson Teixeira atraíram seguidores, amigos, familiares e anônimos que se tornaram fãs de carteirinha e após a cantoria, no hall de entrada do teatro, espremeram-se entre os demais em busca de um autógrafo, um abraço, uma selfie, ou um imagem ao lado dos quatro.
Os shows do projeto cultural 4 Cantos, que contam ainda com as participações de Bruno Bernini (bateria) e Ricieri Nascimento (baixo), além do técnico de som Dado Pires, mesclam autêntica moda caipira, folk, samba, folias de reis e “rock pé rachado”, com doses de contação de causos na medida certa para o riso. São cantadores independentes que encaram a labuta quase colocando grana do bolso para levar além a proposta de valorizar as tradições, a beleza e a simplicidade da vida no campo, sem malhar o ritmo urbano hoje muito bem expresso pelo termo “correria”. Juntos no palco, Cláudio Lacerda, Luiz Salgado, Rodrigo Zanc e Wilson Teixeira sugerem uma “pausa”, uma respirada mais funda para percebermos o que há de melhor tanto no idílio da roça, quanto no pulsar frenético da cidade, experimentado um modo de vida mais descontraído e harmônica, no qual caiba tanto o trabalho, quanto a prosa descompromissada, o direito à poesia, ao sonho, e por que não? ao choro gostoso da saudade que compõem os rios interiores cujas águas, com o correr do tempo, acabam sendo poluídas e perdem o encanto, deixando às margens as pequenas alegrias e celebrações que deveriam ser cotidianas.
As “conjuminâncias da vida” fizeram a estrada dos quatro se cruzarem em 2011, inicialmente em festivais dos quais participavam isoladamente já que Lacerda, Salgado, Zanc e Teixeira mantêm carreiras próprias. Há entre eles, entretanto, muitas verdades em comum. Quando empunham os instrumentos, em uníssono ecoa uma engajada voz pela preservação da identidade rural e das riquezas do nosso país, que tanto podem ser o hábito da conversa fiada ao pé do fogão de lenha entre dois compadres, quanto os nossos biomas, entre os quais o Cerrado. Executadas em afinações diversas, as canções têm cheiros, sabores, linguajares, humores, devoção, um pouco de dor. A costura comum é o amor à música de qualidade, expressas em composições riquíssimas e de sofisticadas harmonias que retratam com fidelidade não apenas o caboclo, mas também o índio, o mulato, o tropeiro, nossos guerreiros. E cadê a mídia que não vê nada disso?
Por esta múltipla capacidade de interpretação e de expressão etiquetar os músicos do projeto cultural 4 Cantos, enquadrá-los em um estilo e tentar resumi-los é difícil, soa reducionista. A música que apresentam não é exatamente caipira, embora existam influências. Nem exatamente folclórica, embora existam influências. Nem exatamente guarani, fronteiriça, embora existam influências. Nem exatamente regional, essa denominação que, apesar da tentativa de ser específica, acaba se revelando por demais vaga. Talvez, como o sertão de João Guimarães Rosa, mineiro na gênese e infinito na chegada, as melodias aspirem ao universal.
Compositores, violeiros e cantadores, mais do que oferecer ao público uma oportunidade para rotulá-los – algo que a indústria fonográfica e a crítica ainda não conseguiram com sua acentuada miopia desenvolvida por tanto olhar de esguelha ou literalmente fechar os olhos para esta puríssima vertente — os quatro são “rios que se encontram, misturando suas águas” junto da plateia, com a qual somam alegrias e compartilham mágoas. Afinal, a música do interior – do Brasil e da alma – sempre celebrou momentos de amizade e exteriorizou a angústia do entardecer no campo, hora de solidão e nostalgia.
“Em nossos shows conversamos com o público entre as nossas canções. É um momento de contato, saciamos curiosidades, contamos ‘causos’, essas coisas. Falamos também sobre nossas pesquisas culturais e sobre o projeto 4 Cantos”, explica Rodrigo Zanc. Para Cláudio Lacerda, o 4 Cantos não se limita às exibições. “Trata-se de um projeto cultural. E aproximar o público da arte e do universo artístico é um dos objetivos.”
“Nosso público reúne desde gente interessada em conhecer instrumentos, principalmente a viola, até gente que pretende apenas se descontrair, e felizmente podemos dizer ao final deles que todos saem satisfeitos e querendo saber quando voltaremos à cidade”, comentou Wilson Teixeira. “A palavra-chave é ENCONTRO. Também nós nos encontramos, vindos de estradas diferentes, e construímos um caminho”, observou Luiz Salgado. “Dividir essa diversidade de origens e essa unidade de propósito com o público, em encontros diretos, feitos de proximidade, é uma maneira de trazê-lo para a nossa jornada.”
CLÁUDIO LACERDA
Paulistano filho de mineiros, Cláudio Lacerda estreou em 2003, ao lançar Alma Lavada. Dois anos depois, venceu o I Prêmio Rozini Nacional de Excelência da Viola Caipira, promovido pelo IBVC (Instituto Brasileiro de Viola Caipira) como melhor intérprete, feito repetido nas outras duas edições, realizadas em 2010 e em 2013. Já dividiu palco e faixas de seus discos com nomes como Dominguinhos e Renato Teixeira. Em 2007, gravou seu segundo álbum, Alma Caipira, e, em 2010, o autoral Cantador.
Atualmente Cláudio Lacerda está em estúdio gravando um novo trabalho, Estradas do Sertão, com participações de Neymar Dias (viola caipira, baixo, violão) e Toninho Ferraguti (acordeon), que reunirá músicas de autores consagrados como Tom Jobim e Chico Buarque. Ele também produziu, recentemente, Trilha Boiadeira, com canções sobre a atividade de boiadeiro, dele em parceria e com participações de Adriano Rosa e vários ícones da música de raiz como Neymar Dias, Zé Paulo Medeiros, Teddy Vieira, Almir Sater, Renato Teixeira e Paulo Simões para marcar os 10 anos do canal Terra Viva.
LUIZ SALGADO
Mineiro de Patos de Minas, suas composições são ligadas ao folclore, exaltando a biodiversidade e a cultura do povo do cerrado. Participou de vários festivais, venceu alguns deles, como o Canções para Arteiros, do Itaú Cultural, em 2009 e gravou os discos Trem Bão (2003), Sina de Cantadô (2007), e Navegantes (2010), além do DVD Noite e Viola(2012). Em 2013, em parceria com Katya Teixeira, fez o álbum 2 Mares.
Luiz Salgado já começou a gravar Quanto mais meus óio chora mais o mar quebra na praia, cuja faixa título vem cantando com o 4 Cantos. Esta empreitada pode contar com a colaboração dos amigos e admiradores mediante contribuição, com direito a recompensas, à plataforma de financiamento coletivo (crowdfunding) partio. Para saber como participar clique em https://partio.com.br/projeto/luiz-salgado/
Luiz Salgado será atração do projeto Imagens do Brasil Profundo e estará de volta a São Paulo na quarta-feira, 15, a partir das 20 horas, na Biblioteca Mario de Andrade (Rua da Consolação, 94, telefone 3775-0002), com entrada franca
RODRIGO ZANC
Pesquisa a viola brasileira e suas influências há mais de 20 anos, lutando incansavelmente pela manutenção e propagação da cultura ligada ao instrumento. É natural de Araraquara, residente na vizinha São Carlos (SP). Participou de vários festivais, dentre eles o Viola de Todos os Cantos, da EPTV – Rede Globo, e chegou às finais de 2005 e de 2007.
Em 2006, lançou Pendenga, o primeiro CD. Em 2010, Rodrigo Zanc foi à Europa divulgar seu trabalho. Em 2013, produziu Fruto da Lida, selecionado para o 26º Prêmio da Música Brasileira. Embora Fruto da Lida esteja ainda apenas dando os primeiros passos, Rodrigo Zanc e seu parceiro, o compositor e letrista Isaías Andrade, já estão a pleno vapor alinhavando um novo álbum, desta vez com faixas apenas de ambos. Uma destas novidades, Dona Pombinha, Rodrigo Zanc já vem mostrando ao público em suas apresentações e também a incluiu no repertório do 4 Cantos.
WILSON TEIXEIRA
A “Terra do Verde”, Avaré, é o berço deste violeiro que também estudou violão e piano erudito. Wilson Teixeira participou de diversos festivais relacionados com a viola ou a música regional, como os de Tatuí (SP), Ilha Solteira (SP), Avaré (SP) e Ponta Grossa (PR). Em 2001, integrou a gravação do CD Ciranda de Cantigas, organizado por Salatiel Silva e Paulo Netho. Em 2004, passou a fazer parte da equipe de músicos dos Trovadores Urbanos. E, em 2007, gravou Almanaque Rural e está finalizando Casa Aberta para lançamento ainda neste semestre.
Saiba mais sobre os músicos do Projeto 4 Cantos e como contratar shows visitando as páginas pessoais dos músicos. O Barulho d’água Música estará atento à agenda e assim que houver novas datas definidas vai dar cobertura integral para informar o público.