
Ao final da noite de abertura da I Mostra de Violas de Arame em Belo Horizonte os cinco violeiros ofereceram ao público uma cantiga com temas do Brasil e de Portugal (Fotos: Marcelino Lima/Acervo Barulho d’água Música)* *Reprodução autorizada apenas pelos artistas, em quaisquer meios, tempo ou lugar
Belo Horizonte (MG) transformou-se entre os dias 11 e 13 de setembro em ponto de encontro para duas formas de manifestações culturais e artísticas do Brasil e de Portugal, durante a I Mostra Internacional de Violas de Arame do Brasil, evento organizado pela Fundação Municipal de Cultura e Viola Brasil Produções que uniu os músicos Chico Lobo, Eduardo Costa, José Barros, Pedro Mestre e Vitor Sardinha. O primeiro, nascido em São João Del Rey e expoente da viola caipira, residente atualmente na Capital, como anfitrião recebeu os convidados, quatro portugueses, cada qual representando uma viola típica de suas regiões — Amarante, Braga, Alentejo e Ilha da Madeira. Eduardo Costa, assim, trouxe a viola amarantina, José Barros a viola braguesa, Pedro Mestre a viola campaniça e Vitor Sardinha a viola madeirense, instrumentos cujo conjunto se designa como Violas de Arame, com sonoridades diferentes, mas que ao serem tocadas por seus embaixadores revelaram nítidas semelhanças com as que soam por aqui nas dez cordas caboclinhas.
O Barulho d’água Música acompanhou na noite de sexta-feira, 11, a abertura oficial da I Mostra Internacional de Violas de Arame, realizada no Centro de Referência Moda, marcada pela apresentação do grupo de Folia de Reis de Santa Rita, da cidade mineira de Santa Luzia. O gestor da I Mostra, violeiro João Araújo, executou o Hino Nacional Brasileiro, honra que coube a José Barros, o qual com sua viola braguesa tocou o Hino Português. Leônidas José de Oliveira, presidente da Fundação Municipal de Cultura, deu as boas vindas aos músicos.
Em seguida, sob uma bandeira de São Gonçalo conforme o santo é representado no Brasil, colocada ao centro do palco, os portugueses ministraram breves palestras sobre as peculiaridades de seus instrumentos, finalizadas com amostras de canções típicas. Pela ordem a palavra coube a Barros, Sardinha, Costa e Mestre; durante a fala de Mestre, ele e Barros, juntos, cantaram duas canções. O encerramento uniu os quatro e Chico Lobo para a apresentação da composição intitulada Lírio Roxo.
A I Mostra Internacional de Violas de Arame foi promovida nos moldes das que ocorrem em Portugal desde 2009 e inserida como atração da III Virada Cultural de Belo Horizonte e ofereceu, ainda, um concerto no Parque Municipal, no domingo, 13, seguido por uma oficina, novamente no CRM.
Sobre os violeiros e as violas
Eduardo Costa é professor que estudou também Educação Visual e Tecnológica na Escola Superior de Viana Castelo, nascido em Braga, atualmente morando em Amarante, berço natal de São Gonçalo, santo que no Brasil passou a ser o padroeiro dos violeiros. Dedica-se à viola amarantina desde o início da criação do Propagode Associação Cultural e Musical, em 2011. Também idealizou e criou o projeto “Viola Amarantina- Apaixona-te de Novo”. Promove o ensino a jovens e a adultos e já iniciou uma fase de realização de concertos “a solo” em que a viola se mostra como instrumento versátil.
Viola Amarantina – Típica da região do Douro Litoral, é também conhecida por Viola de Amarante e Viola de Dois Corações. É tocada de rasgado, com todos os dedos percorrendo as cordas. Em Cabo Verde violas amarantinas chegaram a ser construídas no início do século XX, sendo chamadas simplesmente de violas. A sua construção passou a ser usada para a guitarra de 12 cordas. No entanto, nos últimos tempos, os instrumentos tradicionais portugueses, sobretudo os cordofones, têm vindo a ser mais divulgados e utilizados, sem exceção para esta viola.
José Barros – Lisboeta nascido em 1960, cerca de 20 anos depois despertou interesses pelos instrumentos tradicionais de cordas, entre eles a viola braguesa. Paralelamente descobre o gosto pelos cantares tradicionais de todas os regiões do país. Frequentou o Juventude Musical Portuguesa e a Academia dos Amadores de Música de Lisboa onde cursou o disciplino de Canto. É responsável pelo projeto Trinado de dinamização e de divulgação dos instrumentos tradicionais de cordas. Fundador e do grupo José Barros e Navegante.
Viola Braguesa – Instrumento popular do Noroeste Português, entre Douro e Minho e, sobretudo do Minho, figurando nas rusgas (as rusgas minhotas são grupos festivos que se podiam ver a caminho das festas e romarias e nos trabalhos coletivos da região, acompanhando a dança que espontaneamente se organizava), chulas e desafios, que são as formas músico-instrumentais dominantes na região. Ela toca-se a solo ou a acompanhar o canto, ou mais correntemente, ao lado do cavaquinho, e, modernamente, da guitarra (mais raramente com a rabeca e bandolim), harmônica e acordeon a par dos idiofones rítmicos e fricativos, como o tambor, os ferrinhos e o reque-reque.
Vítor Sardinha – Nasceu no Funchal, em 1961. Seu trabalho é influenciado pelos mais variados estilos musicais, desde o jazz à música erudita, passando pela world music e outros. Professor de Viola Madeirense no Conservatório de Música de Funchal. Em 1997 lançou o álbum Terras da Vera Cruz e posteriormente Gestual Sonoro, Águas Mansas e Asas de Gavião. Trabalha também como musicólogo e realiza várias investigações sobre música e cultura populares. Desenvolveu arquivo sonoro de músicos e orquestras madeirenses (1926-1974) que envolve todas as culturas musicais a partir de gravações existentes na RDP, Lisboa, com o apoio da DRAC.
Viola Madeirense – É congênere das violas portuguesas. Armada com nove cordas tem por afinação do agudo para o grave: ré, si, sol, ré, sol. Instrumento predileto do acompanhamento do Charamba, Mourisca, Bailinho e Baile da Meia Volta (na Ilha do Porto Santo), a Viola de Arame sofreu algumas alterações ao longo do tempo, mantendo, no entanto, a sua afinação. Com um leque de novos músicos, a Viola de Arame madeirense busca no presente caminhos de incentivo e enunciados novos, tendo a composição instrumental ganho uma dinâmica ao patamar das apresentações públicas e das edições discografia.
Pedro Mestre é natural da Aldeia do Sete (Castro Verde) tem a sua vida dedicada à música tradicional alentejana. Desenvolve projetos enquanto tocador/luthier de viola e fundador/ensaiador de grupos corais alentejanos. Integra os projetos musicais: Encontro de Violas- Viola Campaniça e Viola Caipira – Pedro Mestre e Chico Lobo; Les Voix Du 7 Sóis; Orquestra do Festival Sete Sóis Sete Luas; Grupo Viola Campaniça; grupo de cante tradicional 4uatro ao Sul. Dedica-se também à recolha etnográfica. É presidente da Associação de Conte Alentejano Os Cardadores desde 2004.
Viola Campaniça – Descendente da viola barroca, a viola popular portuguesa chegou até nós com cinco cordas duplas. No Baixo Alentejo tomou o nome característico de viola Campaniça. A origem do nome vem da radicação na zona do “Campo Branco”, geograficamente situada na região dos conselhos de Aljustrel, Ourique, Castro Verde, Almodôvar e parte do conselho de Odemira, Na primeira metade da década dos anos 1980, verificou-se que os tocadores deste instrumento já estavam todos em idade avançada, entre os quais é de se destacar: Manuel Bento (Funcheira) e Francisco António (Ourique-Gare). Ao acompanhar o cantar ao desafio, as modas Campaniças ou os passos simples de uma breve dança, o seu dedilhar é hoje uma sonoridade familiar.
Chico Lobo – Um dos mais ativos violeiros, há mais de 30 anos desempenha papel de “ponte” entre o som do interior de MG, do Brasil e o som contemporâneo. Seu carisma o levou a inúmeros palcos do Brasil e do mundo, onde sempre brinda o público com shows ricos em causos,canções e solos de viola. Lançou mais de 20 obras (entre CDs e DVDs). Idealizou e apresenta os programas O Canto da Viola, na Rádio Inconfidência, e Viola Brasil, na TV Horizonte há 12 anos. Fundou na cidade natal, São João Del Rei, o “Instituto Chico Lobo”que atende escolas da zona rural com aulas de viola. Percorrer o mapa mundi da carreira deste artista ajuda a tornar a aldeia global mais caipira.
Viola caipira – Conhecida também por viola de 10 cordas, viola sertaneja ou viola brasileira – descende da viola de arame portuguesa, que chegou ao Brasil pela mão dos primeiros jesuítas e colonizadores. No início da colonização ocorreu uma mistura entre a cultura europeia e a indígena. A viola, trazida pelos portugueses, começou a ser reinventada, ou seja, passou a ser construída com materiais regionais como tripas de animais para as cordas, por exemplo. É utilizada tradicionalmente em diversas manifestações da cultura popular como folias, catiras, batuques, fandangos, cururus, congados e inúmeras mais.
Na região de Minas Gerais, durante o período do ouro, a viola difundiu-se ao seguir as pedras da estrada real. Presa entre montanhas, na beira de rios, ali ganhou características únicas, afinações, folguedos e cantigas. Atualmente a viola assume-se como porta-voz de uma cultura interiorana, sendo divulgada por meio de inúmeros jovens desejosos de conhecerem o instrumento e de trazerem de volta o vasto conteúdo cultural tradicional e caipira nela inserido.
Um comentário sobre “644 – Chico Lobo recebe portugueses em Beagá (MG) para I Mostra de Violas de Arame”