O Barulho d’água Música recebeu da própria cantora uma joia, lapidada com sambas da melhor qualidade e interpretação, todos de autores do Triângulo Mineiro, região na qual estão Uberlândia e Uberaba, cidades mais afamadas pelas criações dos seus violeiros e expoentes da música de raiz e regional, entre os quais São Dércio Marques. Pois é, mas naquelas bandas a cuíca também ronca, uai! Graças a Deus, e mescladas com outros instrumentos que fazem balançar as cadeiras e colocam na roda de bambas Karine Telles, uberlandense que gravou, em 2011, Flor do Samba, seu primeiro disco autoral.
A moça da qual tratamos não é só mais uma sambista, ah, não senhor. Karine Telles tem um timbre dos mais sublimes e marcantes neste gênero no qual muita gente se arrisca a quebrar o salto da sandália, é ruim da cabeça, doente do pé e do gogó, mas causa achando que está fazendo verão — normalmente nas asas de andorinhas que confundem o tilintar das moedas com o triturar das moendas enquanto moem nossos pobres ouvidos e corações. Karine Telles, não. Para ela o céu, com certeza, não será o limite. E nem seu voo será cego: abra as asas sobre nós, ó senhora!
O disco Flor do Samba saiu com recursos da Lei de Incentivo à Cultura por meio da empresa Sankhya, com participações especiais de Luizinho Sete Cordas, Oswaldinho do Acordeon e Coral de crianças da Casa do Caminho do bairro Joana Darc, entre outros ilustres convidados. Em show de lançamento em sua cidade natal no dia 1 de dezembro de 2011, véspera do Dia do Samba, Karine Telles contou com direção do diretor teatral Elias Andreato, timoneiro de muitos mares navegados e que já conduziu palcos estrelados por Maria Bethânia, Paulo Autran e Marília Pera, entre outros astros.
No repertório de Flor do Samba há músicas da própria Karine Telles e outras assinadas por Luiz Dillah, Luiz Salgado, Rodrigo Santiago, Suely Telles, Virgílio Azevedo e Carlin de Almeida – este, com Mauro Mendes, autor de Congada, que apresentou em junho de 2012 no Sr.Brasil, também faz parte de e tempera com pitadas de terreiro Fruto da Lida, do cantador paulista de Araraquara Rodrigo Zanc (2013). Toda a produção de Flor do Samba ocorreu em São Paulo, sob a coordenação musical de Luizinho Sete Cordas e os ouvidos atentos (simplesmente!) da conterrânea Consuelo de Paula, coautora de Beija Flor do Cerrado com Luiz Salgado e faixa que no álbum conta com a participação das crianças da Casa do Caminho, do bairro Joana Darc, onde Karine ministrou uma oficina de iniciação musical. A casa, mantida pela empresa Sankhya, patrocinadora oficial do disco, cuida de crianças em situação de vulnerabilidade social.
Karine Telles reside em São Paulo. Em Sampa, entre outros eventos, apresentou-se ao lado de Adriana Moreira, Ilana Volcov, e Karina Ninni em show de tributo ao compositor Nelson Cavaquinho, cujo nascimento completava 100 anos, no Centro Cultural São Paulo. Em Notícias dum Brasil 4, o mais recente lançamento de Eduardo Gudin que ainda está quentinho nas lojas, Karine interpreta Tempo de Espera mostrando, enfim, ao público o samba que Gudin e Paulo César Pinheiro tinham na gaveta desde a década de 1980 e era inédito em disco. Karine Telles forma Notícias dum Brasil com Cezinha Oliveira, Ilana Volcov, Karine Telles, Mauríciso Sant’Anna, Ewerton de Almeida, Jorginho Cebion, Osvaldo Reis e Raphael Moreira, além de cantar com Renato Braz, outro egresso daquelas fileiras, Água de Minha Sede (Dudu Nobre/ Roque Ferreira), entre outras.
Texto de apresentação de Flor do Samba, por Virgílio Azevedo
“Penso que Karine nasceu dentro de um surdo e só saiu de lá quando ouviu um pandeiro revivendo as platinelas da dona Eleuza, a matriarca guerreira que colocou no sangue desta “menina” o espírito da luta e da vitória, apesar de toda e qualquer dificuldade. Quando entrou no grupo “Flor do Samba”, dei-lhe um anel de prata em forma de rosa e a batizei “A flor do samba”. Hoje, emocionado e orgulhoso por por sua trajetória e dedicação ao samba, sou seu compositor. Havia quem duvidasse que essa “menina” fosse chegar lá. Menos os que a conheceram como eu. Mas a maioria sentia um vigor de espírito interminável e apostava que tudo era só questão de tempo e de maturidade.
Vejam aí, a “menina” do Flor do Samba, do Eterna Chama, nos braços do povo do Brasil. Saia da frente! Vem ai Karine Telles, levantando poeira, fazendo sorrir, fazendo chorar, na batida perfeita do surdo que, agora, já pode escutar. Nas platinelas do pandeiro, na flor da pele de quem sabe que o é o que é ser brasileiro.
Viva a Flor do Samba!