O Grupo Varal de Chita Arte Cultural, formado pelo casal Alberto Camargo e Regina Vasques, pela filha Luísa Vasques e pela amiga da família Isa Ferreira costurou um repertório bem caseiro (no melhor sentido da palavra, o relativo à terra onde se habita e à qual deliciosamente pertencemos e estamos ligados) para tecer o espetáculo Reisal, oferecido em noite de estreia para amigos e admiradores no sábado, 17, na sede do Núcleo Pau Brasil Educação e Cultura, situado no bairro Jardim das Flores, em Osasco. Município distante 18 quilômetros de São Paulo, com acesso rumo ao poente pelas rodovias Castello Branco e Raposo Tavares, Osasco é berço fértil de artistas de várias vertentes, que lá nasceram ou o adotaram para reforçar o perfil de lugar efervescente já desde antes de sua emancipação da Capital, em 1962. Dos quatro integrantes do Varal de Chita, Regina e Isa (vozes) e Alberto (violão e viola caipira) são militantes entranhados e parte da história cultural osasquense, com passagem pela Vila dos Artistas, coletivo de produção de arte, de cultura e de entretenimento que deixou saudades e funcionou até meados da década de 1980 no Jardim Cipava.
Bilo Mariano, Zeca de Souza e Reinaldo Luz são frutos desta videira e assinam a bela Natureza, uma das canções que o Varal de Chita escolheu para começar a dar seu recado e a por o pé na estrada com muita brasilidade. Reisal, como está descrito no programa do show, “é música da terra, música da vida, música de encantamento e alegria, não inclusa em nenhuma categoria pré-estabelecida. Tem suas próprias características e, ao mesmo tempo, é uma mistura de tudo o que já ouvimos”.
Tomando as palavras do grupo é por isso mesmo que as músicas são boas: um dia já foram cantadas por nós e compõem nosso inconsciente coletivo como bens e conjunto de valores atemporais, elos intergeracionais que nos identificam, igualam-nos e jamais perecem, pois como ocorre com o bom vinho que nunca azeda, melhoram à medida que envelhecem e resistem ao tempo — sobretudo se ganham arranjos enriquecedores tanto das melodias, quanto dos conteúdos, como fez com propriedade o Varal de Chita, sem recorrer a nenhuma sofisticação instrumental ou engenharia tecnológica — e podem ser sorvidos em finas taças: as vozes de Isa e Regina, a primeira de timbre mais licoroso, outra mais tinto, embora ambas harmônicas e de teor que no máximo causam o suave torpor da saudade da roça, de um tempo no qual o relógio estava na posição do sol e as estrelas guiavam os caminhos, que se podia perseguir vaga-lumes ouvindo ao longe o apito de um trem. Ou vendo a lua refletida em uma lagoa, encantada, enquanto na asa do vento chegava o cheiro do milho verde cozendo em uma festa de fazenda.
A sugestão do Varal de Chita é o reverso de uma receita manjada, cesta de versos que tem meninos, aranhas, pássaros que dão beijos vermelhos, lendas e vivências em suas letras. São cantigas, modas ou canções para curtir enquanto se engoma a calça, sem pressa. Do caipira ao baião, captam a ciência dos marimbondos que constroem suas casas ao passo em que o danado do sabiá experimenta o sabor da liberdade riscando o azul… após fazer o buraquinho na gaiola; convidam-nos a ficar de bobeira, de papo pro ar, à espera da puxada na linha! Vestido de chita, o grupo, agora quer ir mais longe e neste primeiro passo lançou a proposta: quem ainda não conhece a Yara, mas está muito bem e vivo, que embarque neste trem; mas ocupe seu assento, também, quem não desconhece. E olha que o passeio nem precisa ser janela para a devida apreciação as paisagens que se descortinarem lá fora: basta fechar os olhos que um monte de belezas virá enquanto a composição atravessar os campos das lembranças ou da imaginação. A viagem será da mais agradável e você, com certeza, voará.
O Grupo Musical Varal de Chita é uma iniciativa do Núcleo Pau Brasil Educação e Cultura e ensaiava já há seis meses o repertório de Reisal. Desenvolve trabalhos de pesquisa e de valorização de vertentes independentes da autêntica música brasileira como a popular, a regional e a caipira, priorizando composições que evocam entre outras sensações que emocionam e nos transportam para outras paisagens o cheiro de terra. Compõem a lista, entre outras, Vagalume (Charles Boavista e Zé Américo); Natureza (Bilo Mariano, Zeca de Souza e Reinaldo Luz); Voarás (Paulinho Pedra Azul), Marimbondo (Marlui Miranda e Xico Chaves) e Açude Encantado (Charles Boavista e Waldir da Fonseca). Alberto Camargo, Regina Vasques, Luiza Vasques e Isa Ferreira são destacados artistas, educadores e produtores culturais do município onde o Núcleo Pau Brasil promove diversas atividades com viés construtivista e mantêm, ainda, a Companhia de Folia de Reis Belo Sol de Santa Maria de Osasco (que sai desde 1994), o Bloco Carnavalesco Bela Época (2008), o Grupo Sol em Canto (coral que uma vez por mês visita casas que cuidam de pessoas, para as quais cantam e dançam também desde 2008) e uma quadrilha junina.
Participação especial
O recitador Paulo Netho participou do primeiro show do Varal de Chita declamando a convite dos anfitriões o poema dele intitulado Acessar. Paulo Netho estreou no dia 13 de outubro Casa Cara de Pavio, programa que grava no estúdio da Núcleo Pau Brasil e é levado ao ar em canal do Youtube todas as terças-feiras, às 19h30.
O poeta também é de Osasco e vem tornando-se conhecido no país não apenas por seus divertidos livros de poesias e de gêneros como parlendas, trava-línguas, crônicas e cantigas, mas ainda pelas apresentações sempre concorridas de projetos como o Balaio de Doi2, ao lado dos músicos Salatiel Silva e Ricardo Kabelo. Em Osasco, todas as quartas-feiras, ele recebe amigos e artistas aos quais abre o microfone entre 20h30 e 21h30 para declamações, leituras e cantorias no restaurante Sr. Glutton, palco das rodadas do sarau Poesia Futebol Clube que sempre terminam em animadas sessões de bate-papo.
Ciranda de cantigas
Em 31 de outubro e 1 de novembro, a partir das 11 horas, reunidos no grupo Ciranda de Cantigas, Paulo Netho, Salatiel Silva, Ricardo Kabelo, Vinícius Bini e Gustavo Pompini promoverão no Sesc Jundiaí (SP) show durante o qual recorrem à oralidade para apresentarem quadras adivinhas, trava-línguas e acalantos com o intuito de entreter e fazer rir crianças de todas as idades. Durante o divertido número, consagradas cantigas de roda recebem arranjos musicais que passam pelo samba, baião, blues e rock’n roll, receita infalível que para os adultos vale como bilhete de mágica volta à infância e às crianças permite o prazer de ingressar no mundo da música e da literatura, de forma divertida e prazerosa.

Ricardo Kabelo, Vinícius Bini e Gustavo Pompini, com Paulo Netho (de boné) e Salatiel Silva formam o Ciranda de Cantigas (Foto: João Barboza)
O Ciranda de Cantigas foi criado em 2002 por Salatiel Silva depois do lançamento de livro-CD homônimo. E tanto o livro como o show é o resultado de uma extensa pesquisa que procurou preservar e explorar o critério da diversidade regional – que, em muitos momentos, possibilita à criança fazer comparações divertidas entre a versão da sua região e de outras mais longínquas.
O restaurante Sr. Glutton fica na rua João Teixeira Machado, 243 , vila Campesina, Osasco, e tem o número de telefone (11) 3682-3592. Já o Sesc Jundiaí está na rua Antônio Frederico Ozanan, 6.600, e para mais informações dispõem do número de telefone 11 4583-4900.
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