
O Ilumiara vai lança o disco em Beagá, mas antes promove turnê na Bahia, no Acre e no Pará: Foto: Raphael Carmona/Sistema Fecomércio/DF
Fonte do texto: Grupo Ilumiara
Cantar e trabalhar são necessidades humanas universais. Em cada tempo e lugar, o teor da vida indica o entoar de cantigas, de danças e de batuques que se ligam a gestos e modos de fazer. Das peculiaridades étnicas, geográficas, históricas e culturais deriva o universo diversificado dos chamados Cantos de Trabalho. Inspirado por esse universo, surge o Grupo Ilumiara, que está lançando seu primeiro disco, totalmente dedicado aos cantos de trabalho, e em dezembro vai apresentá-lo em Belo Horizonte (MG). O Ilumiara foi convidado pelo Sesc para apresentar esse repertório de cantos de trabalho dentro do projeto Sonora Brasil e realizar 130 concertos em todos os estados do Brasil. A turnê teve início em julho e prosseguirá até o segundo semestre de 2016. Em 2015, serão contempladas plateias das regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste. Na segunda fase, em 2016, o público das regiões Sul e Sudeste.
Formado por Alexandre Gloor, Carlinhos Ferreira, Leandro César, Letícia Bertelli e Marcela Bertelli, o Grupo Ilumiara tem seu repertório marcado por cantigas que vêm dos mestres da tradição em Minas Gerais e de fontes sonoras e textuais de diversos outros pesquisadores tais como Mário de Andrade e Ayres da Mata Machado. O disco, gravado e mixado por Bruno Correa e masterizado por Chico Neves, tem arranjos elaborados pelos músicos Kristoff Silva, Rafael Martini, Felipe José e Leandro César, que também realizou a produção musical. Sérgio Pererê canta como convidado em faixa especial sobre os Vissungos, cantos tradicionais dos negros da região de Serro e Diamantina (MG).
A expressão Ilumiara mescla as palavras iluminar à Iara, entidade sagrada dos rios nas culturas Tupi-Guarani. Também contida nos textos de Ariano Suassuna e no nome de seu “altar” na Pedra do Reino, a palavra expressa nosso desejo de iluminar, por meio da música e da poesia, a riqueza e a beleza de repertórios poéticos e musicais a partir da pesquisa e do encontro com as pessoas.
Alexandre Gloor é licenciado em Educação Artística pela Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG), onde desenvolve, desde 1994, intenso trabalho didático como professor de viola e violino e atualmente, rege a Orquestra de Extensão da UEMG. Dedica-se à pesquisa e interpretação da rabeca.
Carlinhos Ferreira é percussionista, professor, pesquisador de cultura popular e construtor de instrumentos. Desde 1989 dedica-se ao ensino da percussão e da construção de instrumentos percussivos, realizando dezenas de oficinas em festivais, no Brasil e exterior. Como músico, atua principalmente com os violeiros Chico Lobo e Pereira da Viola e, ainda com Déa Trancoso, todos de Minas Gerais.
Leandro César é violonista, arranjador, compositor e construtor de instrumentos. Desenvolve um trabalho de construção de novos instrumentos musicais e trabalha na manutenção e restauração dos instrumentos do grupo Uakti.
Letícia Bertelli é bacharel em canto pela UEMG, pós-graduada em canto – música antiga pela Staatliche Hochschule für Musik Trossingen, da Alemanha, e mestranda em musicologia pela Universidade de São Paulo, sob a orientação de Ivan Vilela. Dedica-se ao estudo da Cantoria e à performance da música histórica, com ênfase para a música medieval, barroca e repertório brasileiro de tradição oral.
Marcela Bertelli é antropóloga pela UFMG, estudou música e dança na Fundação Clóvis Salgado (MG). Pesquisadora na área de música, atua em documentação, registro e produção de conteúdos em projetos diversos, em mobilização comunitária, leitura poética e em processos criativos que envolvem música e antropologia. “Não se trata de imitar os cantadores tradicionais”, observa Marcela. “Partimos dos fundamentos originários da música de tradição e trabalhamos e utilizando vozes e nossa instrumentação, criamos novas experiências criativas, estéticas e afetivas, a partir do nosso fazer artístico. Há, por exemplo, a Toada dos Remeiros, cujo arranjo original para orquestra de cordas, feito por Ernst Widmer, foi utilizado como inspiração para o Leandro César e o grupo compor novo arranjo utilizando letras das cantigas originais da pesquisas de Oswaldo de Souza no Rio São Francisco na década dos anos 1940. O canto da tradição está lá, rio abaixo e rio acima, mas nós recriamos a partir da nossa sensibilidade, nossa leitura no tempo, nossos instrumentos e vozes, aquilo que forma o Ilumiara”
Kristoff Silva mescla duas belas cantigas de carregadores de pedras. De Diamantina, o grupo conheceu um canto utilizado pelos trabalhadores que calçavam as ruas, cujas pedras de grandes proporções chamadas capistranas fazem evocar a expressão melancólica e sofrida das vozes. A outra cantiga, coletada das fontes sonoras das Missões Folclóricas de Mário de Andrade e cuja gravação original consta de Itabaiana, da Paraíba (há uma cidade homônima, em Sergipe), conduzem ao trabalho ritmado, provavelmente a partir do gesto de tomar a pedra do companheiro e passar adiante, num movimento quase circular.
“No arranjo elaborado para o grupo, trabalhei com duas ideias, a primeira ligada à cidade de Diamantina, onde o canto expressa uma espécie de coro sacro, como na obra de uma catedral, em busca da beleza e da construção do próprio homem. A segunda parte remete a uma sensação vertiginosa, criada pelo esforço do trabalhador no calor intenso do sol de Itabaiana.”
Sobre os cantos de trabalho
São muitos os cantos vinculados a ofícios e saberes tradicionais, e entre eles podemos citar as canções de lavadeiras, das quebradeiras de coco, das destaladeiras de fumo, das fiandeiras, dos machadeiros, dos tropeiros, dos pregoeiros, dos trabalhadores das antigas usinas de açúcar, de carregadores de pedras, de remeiros, de vaqueiros, de lavadeiras, de pescadores, da fabricação de farinha e doces, dentre tantos outros. Além destes, podemos lembrar os cantos de mutirão, feitos em torno da organização de um trabalho que necessita participação comunitária ou força maior para ser realizado, sobretudo em regiões rurais, como carpir trechos maiores de terra e construir casas.
Há algo nos cantos de trabalho que nos afirma não apenas nossa necessidade de beleza, mas a solidariedade social necessária à condição de vida. A música, na verdade, é a expressão do que se sente e precisa ser dito. Pode ser uma crítica ao peso do trabalho, louvor à beleza da natureza em volta, a crença nos santos protetores, a saudade da mulher que ficou esperando o companheiro voltar da lida, a repetição de um som que aprendemos a vincular a determinados produtos de ambulantes, as onomatopeias imitando sons de ferramentas, uso de pés e mãos na matéria a ser transformada.
Sabe-se que muito do que se cantava e tocava foi perdido ou despareceu junto ao próprio desenvolvimento dos ofícios, pela substituição do trabalho humano por máquinas, a perda de línguas originárias de povos (sobretudo indígena e negra), com processos de êxodo e de migrações, por influências estéticas dos meios de comunicação, e mesmo por meio de processos de evangelização que dificultam a permanência de certas tradições.
Para saber mais sobre o Ilumiara acesse https://www.facebook.com/ilumiara. Ouça as músicas em https://soundcloud.com/ilumiara/sets/ilumiara-2015. Há uma versão que pode ser baixada em mp3 do blogue Quadrada dos Canturis , mas o Barulho d’água Música recomenda contato com o grupo para compra do álbum, gesto que não apenas demonstraria respeito e valorização aos músicos e demais profissionais que trabalharam, geralmente de forma independente, para produzi-lo, sem contar com informações técnicas e projeto gráfico do encarte.
Em novembro, o Grupo Ilumiara cumprirá a seguinte agenda:
2, Barreiras (BA) ╞ 4, Vitória da Conquista (BA) ╞ 5, Jequié, BA ╞ 6, Santo Antônio de Jesus (BA) ╞ 7, Feira de Santana (BA), ╞ 9 Paulo Afonso (BA) ╞ 11, Rio Branco (AC) ╞ 13, Castanhal (PA) ╞ 14, Belém (PA)