995 – Para além do boto-cor-de-rosa: conheça o Imbaúba, grupo fundado pelo poeta Celdo Braga que canta o universo da Amazônia

“O Brasil não conhece o Brasil”, em uma adaptação do refrão que remete às Querellas do Brasil,  na qual Aldir Blanc e Maurício Tapajós escreveram “O Brazil não conhece o Brasil” para a canção imortalizada por Elis Regina em Transversal do Tempo (1978), é um bordão difícil de contestar em qualquer campo ou assunto artístico-cultural que se ponha em debate na roda. Para ficar apenas no vasto terreiro da música de Pindorama, a se julgar pelas playlists da maioria das emissoras de rádio, ainda vale mais por estes trópicos a frase original de Blanc e Tapajós, aquela com “z”. Em um país que  embora apresente variedade de estilos e de ritmos – que vão do samba ao caipira, do baião ao chamamé, do fandango ao xaxado, do choro ao Clube da Esquina –, tem prevalecido a porcaria movida tanto a jabá, quanto pela preguiça de programadores — se ruins ou sonsos, mesmo, pouca diferença faz. Entretanto, desde que a internet passou a oferecer ferramentas não apenas para divulgar, mas também compartilhar obras e carreiras, os hábitos de consumo e de produção de música vêm mudando, possibilitando a criação de públicos mais críticos, pluralistas e exigentes. E nesta onda blogues e serviços de streaming conseguem democratizar e oferecer (a baixos ou totalmente sem custos) não apenas novidades e lançamentos que a mídia teima em desprezar, sobretudo os alegadamente “independentes”, deixando disponível na rede para serem baixados em tablets, computadores e celulares conteúdos dos mais diversificados, ecléticos e muito, muito bons.

O Terra Brasilis é um exemplo dos mais ricos neste nicho da blogosfera dedicado à espalhar música de qualidade e dar um totó na mesmice midiática.  Álbuns ainda cheirando à recente prensagem ou tão antológicos quanto raros de cantores, duplas, grupos e bandas de vários estados e estilos brasileiros, garimpados por Daniel Lamounier Paim e compartilhados com amigos e seguidores, alimentam inclusive este Barulho d’água Música — que mais uma vez recorrendo a esta mina destaca nesta atualização o trabalho do grupo manaura Imbaúba, nome que remete à árvore que do solo devastado brota, também conhecida como Mãe-da-terra. Da família das Cecropiáceas, produz um fruto macio e doce muito apreciado por aves, morcegos, bicho preguiça e outros animais. Desse símbolo de resistência e inspirado nele surgiu a proposta de o grupo repercutir nas composições matizes sonoras da Natureza que vão de ritualísticas tribais e nuanças do canto dos pássaros ao etéreo bailar de árvores seculares da Amazônia. O resultado é uma projeção sinestésica de ritmos e de sons orgânicos que promovem a perfeita comunhão dos sentidos.

Propondo sensações ainda não vividas, mas pulsantes no seio da floresta, no coração do caboclo e concebidas para disseminar o respeito ecológico, em uníssono o Imbaúba canta, ainda, a esperança e a razão de ser das coisas, a voz engasgada da Natureza devastada, a dança dos banzeiros, o singrar dos rios, a voz da cabocla lavadeira;  canta a humanidade esquecida e o zunir espectral das matas: canta, enfim, a voz do homem disposto a escrever uma nova página de preservação da vida.

Fundado pelo poeta Celdo Braga, o Imbaúba reúne os músicos Rosivaldo Cordeiro, João Paulo Ribeiro, Roberto Lima e Sofia Amoedo. O repertório, basicamente instrumental e acústico, revela composições próprias compostas a partir de sonoridades orgânicas: vale captar e registrar, por exemplo, trinados de pássaros, farfalhar de folhas, do remo  e do barulho da água sendo ‘esgotada’ da canoa entre tantos sons e ruídos que ocorrem na floresta, temperados pela magia e pela mística que emanam do universo amazônico. Com este perfil, o Imbaúba já lançou cinco álbuns autorais e uma coletânea e dois discos autorais e vem trilhando sua trajetória dentro e fora do Brasil, oferecendo concertos até mesmo para autoridades que visitam o Amazonas, uma delas, Charles, o príncipe herdeiro do trono inglês, em 2009.

A poesia do Imbaúba, em síntese, verte da pena de um nativo vocacionado em cantar a Amazônia, lastreada em sua vivência ribeirinha, mas igualmente engajado à literatura universal. Formado em Letras pela Pontíficia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Celdo Braga nasceu em Benjamin Constant (AM), cidade a 1.118 quilômetros de Manaus, na fronteira com o Peru. É membro da União Brasileira de Escritores com carreira musical que completou em julho 35 anos marcada pela atuação, também, junto ao grupo Raízes Caboclas (projeto artístico-musical já extinto,  também centrado na temática amazônica, anterior ao Imbaúba) e, mais recentemente, o novo Projeto Gaponga.

O contato de Celdo Braga com a arte começou quando ele tinha apenas 11 anos, ainda em Benjamin Constant. Na escola, participou e tirou o primeiro lugar de um concurso com o poema Faça o bem sem olhar a quem. Aos 15 anos, o jovem conheceu outro poeta, argentino (de cujo nome não se lembra mais), que o incentivou a singrar os rios da poesia. Já seu pai  “de criação”, como ele se refere ao nordestino que o criou, estimulou-o a ir adiante neste caminho por meio da literatura de cordel. Hoje, as próprias vivências e raízes o ajudam a escrever e compor. 

João Paulo Ribeiro, natural de Parintins (AM), adquiriu vasta experiência atuando em festivais e com artistas, em âmbito regional e nacional, como membro do Imbaúba ou músico convidado em outras formações. A bateria é seu instrumento básico, bateria, mas Ribeiro é admirado pela capacidade de misturar os sons de vários outros de percussão e pela forma particular de executá-los,  inclusive os de criação artesanal própria.

Rosivaldo Cordeiro Santana, violonista nascido em Manaus, iniciou seus estudos em violão aos 11 e com 14 anos de idade já tocava em bandas da cidade. Um ano depois, já dominava com a mesma habilidade outros cordofones como cavaquinho, charango, bandolim, banjo, guitarra e violãode 7 cordas, passeando assim por todos os ritmos inerentes aos instrumentos. Hoje além de músico de destacado prestígio, membro do Grupo Carrapicho, do Imbaúba e líder do grupo de choro Jacobiando, é produtor musical e arranjador com vários registros fonográficos.

O paraense de Santarém João Roberto Pereira Lima  começou a carreira musical em corais de igreja, aos 10 anos. Aos 14 matriculou-se na escola de violão e passou a cantar como acompanhante em eventos musicais e festas da cidade. Ao desembarcar em Manaus, em 1998, ingressou na banda Coquetel e seis anos mais tarde iniciou a carreira solo, tendo como marco a participação no Fecani. Roberto Lima tornou-se atração também em casas noturnas e bares temáticos manauras e além da participação nos álbuns do Grupo Imbaúba, lançou Olha já – Nas águas do amor – Cantando poemas de Celdo Braga.

Sofia de Sousa Amoedo desenvolve trajetória artística iniciada em festivais de música em sua terra natal, Terra Santa (PA). Formada em Administração, ganhou admiradores como intérprete da MPB em casas noturnas e bares temáticos não apenas pela bela voz, mas também por conta do talento como instrumentista (violão base).

Mãe da Terra, produzido por, em novembro de 2009
Do solo devastado brota a imbaúba, também conhecida como mãe-da-terra. Desse símbolo de resistência nasce o grupo que empresta o seu nome para reunir em sua proposta as matizes sonoras da natureza: a ritualística tribal, as nuanças do canto dos pássaros, o etéreo bailar das árvores seculares da Amazônia, numa projeção sinestésica de ritmos e sons orgânicos que promovem a perfeita comunhão dos sentidos.
Propondo sensações ainda não vividas, mas pulsantes no seio da floresta, no coração do caboclo e concebidas para disseminar o respeito pelo verde, em uníssono o Imbaúba canta a esperança e a razão de ser das coisas. Canta a voz engasgada da natureza devastada e a dança dos banzeiros.
Canta o singrar dos rios, a voz da cabocla lavadeira, canta a humanidade esquecida e o zunir espectral das matas. Canta, enfim, a voz do homem disposto a escrever uma nova página de preservação da vida.

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Canta Amazônia, produzido por, em novembro de 2009
Em tempos de ajuntamento tribal para formar uma corrente de luz em defesa da Amazônia, o Imbaúba, em ajuri musical, reúne Nilson Chaves e Valmir Pacheco (Pará), Zé Miguel e o poeta Joãozinho Gomes (Amapá), Neuber Uchoa (Roraima), o decano Sérgio Souto (Acre), além dos compositores consagrados no chão musical do Amazonas como Chico da Silva, Candinho, Célio Cruz, Natacha Andrade, Sidiney Resende e Rui Machado. Ganha reforço especial com Tatiana Sobreiro com a sua composição – Dança dos botos e Djuena Ticuna manifestando sua alma nativa em Saudade da aldeia.
A obra é enriquecida com o canto de Zé Vicente (Ceará), que nos brinda com a canção Amazonas é mar eu também sou, composta quando de sua estada em Novo Aripuanã (AM), e com a sensibilidade do padre Valério Di Carlo (Itália), que, do hinário de suas belas composições, oferece-nos O verde Amazonas para registrar os 100 anos da presença benfeitora dos capuchinhos em nossa região.
Mosaico de sonhos, esta obra é um convite a todos os que amam a natureza e desejam unir sua voz em defesa da Amazônia e da vida. Neste puxirum, orquestrado por Rosivaldo Cordeiro, João Paulo, Sérvio Túlio, Sofia Amoedo, Roberto Lima e pelo poeta Celdo Braga, nosso propósito é convidar a todos para fazer de cada ato um gesto a favor do verde e dizer em uníssono: Canta, Amazônia!

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Missa Amazônica, produzido por, em novembro de 2009
E o Verbo se fez carne e armou sua maloca na Amazônia. Tomou o rosto de curumim, banhado nas águas barrentas de seus rios, ou nas negras como a escuridão, iluminadas pelos raios do sol.

Com esta Missa Amazônica, tecida pelo talento do grupo Imbaúba, nossa terra, nossas águas, nossos frutos, nossos animais, encantados e nossa gente, sobem ao céu como orvalho da manhã. As palavras, os ritmos e sons da floresta penetram em nosso coração, como a chuva que fecunda a terra. E, assim, acontece o maravilhoso encontro:

“Deus conosco e nós com Deus”. São canções de louvor pela criação, de pedido de perdão ao Criador e de amor às criaturas. Canções de compromisso e de denúncia, de alegria e de festa. Canções que fortalecem a comunhão, que fazem reviver a esperança.

Dom Sebastião Bandeira Coelho Bispo Auxiliar de Manaus.

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Natal Amazônico, produzido por, em novembro de 2010

A vida a todo instante solicita mudança e transformação para perpetuar, no compasso do tempo, a existencia de cada ser.

Natal Amazônico, obra poética e musical do Grupo Imbaúba, metaforiza o espírito transformativo cristão, expresso nas singelas imagens de um Natal permanente, espelhado em cada flagrante da existência, como nos lembra o poeta Alcides Werk: No reino das amazonas/ há Natais todos os dias/ que vêm rolando dos Andes/ nas águas brancas e frias./ Nas copas das piranheiras/ nos frutos dos araçás/ nos ninhos dos japiins/ nos gestos dos animais./ Há Natais todos os dias/ nas orquídeas nos tajás.

Um olhar atento à vida perceberá no nosso Natal Amazônico a mensagem do Beija-flor trazendo seu Menino Jesus e, Nele, a paz tão sonhada por todos os povos.


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Mãe D’água, produzido por, em Novembro de 2011
Com cinco anos de existência, o grupo Imbaúba fecha um ciclo de sua trajetória artística, iniciado com Mãe da Terra. Fruto desse processo e afinado pelo diapasão dos sons que emanam da floresta, traz à luz seu novo trabalho, Mãe Dágua, que reúne canções já consagradas do cancioneiro regional como Banzeiro (chap-chap) e Cantos da Floresta, do grupo Raízes Caboclas; Olho de Boto, do cantor paraense Nilson Chaves e Cristóvam Araújo; Cunhantã Dourada, de Thiago de Mello e seu filho Manduka; Pescador, de Lucevilson; e Solimões, de Mário Jackson e Zoth, todas entranhadas de telurismo e da mística das nossas águas.
A parte inédita, música e poesia, assinada pelos compositores Celdo, Roberto e Rosivaldo, dá à obra o timbre estético que consolida a identidade do Imbaúba, cada vez mais integrado aos valores culturais e à causa ambiental da Amazônia.
Embarque nessa canoa e tente perceber nas nuances de cada nota a paisagem encantada que esta obra enfeixa. 

Coletânea, produzido por, em novembro de 2012

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