A voz firme e natural da cantora cearense se alia ao piano nítido e preciso do paulista para, juntos, construírem novas interpretações e diálogos com a obra catingueira do sertanez, promovendo fascinante viagem camerística pelo cancioneiro do baiano e suas canções de amor, lamentos de retirantes, histórias de vaqueiros, festas, bênçãos, lugares perdidos
O Selo Sesc está vendendo nas lojas físicas de suas unidades e também pela virtual o álbum Estradar, disco no qual a cantora cearense de Juazeiro do Norte, Verlucia Nogueira, e o pianista paulista de Leme, Tiago Fusco, interpretam 13 canções de Elomar Figueira Mello, com direção artística de João Omar, filho do cantor e compositor sertanez de Vitória da Conquista (BA) e um dos mais geniais artistas da cultura popular brasileira de todos os tempos. Em outubro, por ocasião do lançamento de Estradar, o Sesc publicou em sua seção online Conteudoteca a matéria que seguirá abaixo e em cujo corpo as músicas podem ser apreciadas. O disco também está disponível nas plataformas digitais e pode ser baixado, em versão MP3, do blogue Terra Brasilis.
De acordo com o texto publicado na Conteudoteca, “fica difícil explicar a música do compositor baiano desgarrada de seu contexto geográfico”. Nascido na semiárida Vitória da Conquista, em 1954, Elomar mudou-se para a capital, Salvador, para estudar e compôs algumas canções. Cinco anos mais tarde, ingressou no curso de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (UFBA), concluiu o curso em 1964 e retornou à Vitória da Conquista. De volta à terra natal, “vive da arquitetura, e paralelamente, mantém uma carreira como artista. Este preâmbulo, com poucas linhas de sua biografia, ajuda a destrinchar o início de sua trajetória que se embaralhou por inúmeras vertentes, mas permaneceu fielmente plantada na paisagem do sertão”.
Ainda conforme o texto do Sesc “trata-se de um compositor cuja formação cultural e musical advém de seus vínculos com múltiplas experiências e tradições musicais, tanto regional e rural, que o colocam numa encruzilhada de onde partem e convergem inúmeros caminhos e alternativas”.
A revista ainda traz o ponto de vista de Gilson Rodrigues Bomfim, pesquisador da Fundação Casa dos Carneiros e amigo de Elomar: “Nós denominamos sertão toda região que está distante do litoral e dentro daquilo que se convenciona a chamar assim, ainda podemos ramificá-lo entre sertões: político, geográfico e existencial. Falar de Elomar é falar, sobretudo, desse último, o sertão existencial, cuja obra de sua autoria o faz transcender os limites territoriais e atravessar o tempo.”
É com essa aura que o álbum lançado pelo Selo Sesc solidifica a parceria entre Verlucia e Tiago, juntos desde 2012, quando se conheceram em um curso de música, em São Paulo. “Verlucia e Tiago logo transformaram a afinidade pelas melodias em realização profissional. Entre ensaios e experiências, a dupla interpretou brasilidades distintas até decidirem pelas cantigas populares do cantor e compositor baiano.”

A formação cultural e musical de Elomar advém de seus vínculos com múltiplas experiências e tradições musicais, tanto regional e rural, que o colocam numa encruzilhada de onde partem e convergem inúmeros caminhos e alternativas (Foto: Divulgação)
A fim de ecoar as estradas e belezas de um sertão profundo, prossegue o autor do texto na Conteudoteca, eles tiveram a direção artística do filho e parceiro de Elomar, o violinista João Omar. O mergulho pelo cancioneiro e da prosódia roçaliana, fizeram de Estradar uma obra que não descaracteriza o processo criativo original, pelo contrário, oferece uma nova interpretação ao vocabulário catingueiro.
Para apresentá-lo, o Sesc recorreu ao texto do compositor e pesquisador Lincoln Antonio e a um pequeno glossário que explica termos desse dialeto catingueiro. Essa linguagem, aliás, uma das maiores virtudes de Elomar, foi muito bem explorada na série de vídeos da Ocupação Elomar, promovida em 2015 pelo Itaú Cultural:
“Ó, que caminho tão longo
Tão cheio de pedra e areia
Valei-me meu Padre Cícero
E a Mãe de Deus das Candeias”
Bendito de Nossa Senhora das Candeias
Peço licença, senhoras e senhores! Lá vem uma parelha muito bem emparelhada. Mililégua a caminhar por estradas de pedra, areia, esperança e saudade. Grandes amores, grandes desastres. A história e a utopia de um país chamado Sertão. A canção, que já não é mais popular, nem erudita, alargada em suas possibilidades dramáticas, narrativas e líricas. Inda mais, muito mais. Música épica.
A peleja é fina, precisa e claríssima. São três caminhos que se cruzam e é na encruzilhada que se fazem os trabalhos, se abrem as possibilidades e se confiam caminhos. Aqui os caminhos vêm todos do interior e se cruzam “naquela galáxia em vias de explosão”, São Paulo. Verlucia vem de Juazeiro do Norte, Cariri cearense. Tiago vem de Leme, interior paulista. E Elomar, ainda que baiano, da grande e velha pátria do Sertão.
Entre a canção e a ária, entre o recitado e o galopado, entre a balada e o madrigal, as peças vocais de Elomar estão sempre coladas ao violão, como um organismo só. Poeta-compositor-intérprete, trovador, cantador. O espaço-tempo de Elomar é um Sertão atemporal, “uma ficção de coisas que já existiam, que existem e que ainda vão existir”, como disse certa vez.
Pois nesse CD o piano é quem emparelha com a voz para juntos realizarem uma fascinante viagem camerística pelo cancioneiro de Elomar. Canções de amor, lamentos de retirantes, histórias de vaqueiros, festas, bênçãos, lugares perdidos. Verlucia e Tiago trazem muita clareza às músicas no cuidado intenso com a articulação, na escolha dos andamentos, na cor das palavras. A voz firme e natural de Verlucia se alia ao piano nítido e preciso de Tiago para juntos construírem novas interpretações, novos diálogos com a obra catingueira de Elomar. Ampliando trechos instrumentais num jogo constante entre o claro e o escuro, a dupla explora as várias possibilidades da formação voz e piano e realiza uma experiência inédita com a obra desse compositor.
Se por um lado a presença do piano nos distancia da estética “sertaneza” de Elomar, por outro abre várias possibilidades de recriação de sua obra, especialmente no ambiente da canção de câmara, e colabora com o projeto elomariano de expandir suas criações nas formas da música dita “culta”, como ele mesmo atribui à sua obra.
Apois, este Estradar é um grande acontecimento que reúne a obra de um compositor único, defendida por uma dupla de grandes intérpretes e escreve mais um capítulo da história da canção brasileira e, por que não, da canção universal.
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Bravo!
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Obrigado pelo contato Humberto Firmo! Concordo com seu elogio! Elomar tem uma obra gigantesca e a dupla Verlucia e Tiago conseguiram uma releitura das mais singulares!
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