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As seis faixas de A comitiva de notícias e outras histórias foram gravadas artesanalmente e em fita cassete, com encarte feito à mão, e em breve estarão nas plataformas digitais

Rainer Miranda de Brito, violeiro e antropólogo radicado em São Raimundo Nonato (PI)
Compositor do Interior paulista, nascido em Votorantim, cidade da região de Sorocaba situada a cerca de 110 quilômetros da capital São Paulo, Rainer Miranda de Brito, atualmente residente em São Raimundo Nonato (PI) é violeiro autodidata e antropólogo. Conforme declarou recentemente em entrevista ao jornalista Antonio Carlos da Fonseca Barbosa, da Revista Ritmo Melodia, Rainer desenvolve no estado nordestino como docente da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), situado no campus Serra da Capivara, um projeto de extensão para ensino e fomento da viola de dez cordas no semiárido piauiense, o VÁRIA – Artes e violas na Caatinga. Em um perfeito casamento entre os ofícios de professor universitário e de músico, como um dos métodos e estratégias para resgate e afirmação de uma das possíveis afinações para a viola de dez cordas, a realejo, há sete anos ele vem lançando álbuns da série batizada Áspero, que define como “melodias estranhas para estórias de povos de lugar algum” ou “uma empreitada de narrativas instrumentais de uma viola de dez cordas”.
A série começou em fevereiro de 2014, com Queda & Regresso, prosseguiu com Duas Derradeiras, de maio de 2017, e a Casa de Héstia, de março do ano passado. Neste mês, a obra que Rainer espera completar com seis volumes ganhou o quarto: A comitiva de notícias e outras estórias, cujo repertório narra “estórias sobre a chegada de notícias em um pequeno povoado, uma carta de lembranças entre irmãos e boatos sobre a menina que seguindo um assovio na caatinga deixou de ser gente para ser um pé de espinheira”. Todas as músicas dos quatro títulos já disponíveis de Áspero podem ser ouvidas e baixadas a partir do portal que o autor desenvolveu para dar suporte ao projeto — gratuitamente, inclusive –, mas para o álbum mais recente a novidade é que A comitiva… também foi gravado e produzido em fita cassete!
“Este é um álbum feito à mão, um álbum de retalhos e imperfeições”, declarou Rainer Miranda, sobre o porquê recorrer à fita cassete; em breve estará disponível também nas plataformas digitais. “Eu quis fazer tudo artesanal e analógico. Pensei em vinil, mas os custos ficariam muitos altos e eu tenho outras prioridades no momento. O cassete pode parecer algo estranho, antigo, mas não é. É um formato analógico relativamente acessível e como eu queria fazer tudo em casa, como é a proposta do Áspero, recorri ao VHS, um recurso ótimo para gravar áudio. Farei 50 fitas cassetes como produto final, uma por uma, o que dá um trabalhão. Corta, dobra, imprime, desenha à mão sobre a impressão, é uma doideira. A versão digital que vai para as plataformas digitais eu capturei da fita e já envie para a Tratore”, que será responsável pela distribuição.
A versão disponível para baixar sem custos A Comitiva… o encarte e as cópias da carta, em formato PDF, traz as seis faixas do álbum. Mas este conteúdo do Áspero, como dos demais três álbuns anteriores, também pode ser comprado por quem possa colaborar com Rainer Miranda. A fita cassete custará $6 USD — ou mais, conforme a disposição do contribuinte. O pacote com a fita será enviado aos endereços indicados, pelos Correios, para todo o país e para o Exterior.

O quarto álbum da série Áspero será gravado manualmente em 50 fitas cassetes
De acordo com a Revista Ritmo Melodia, Rainer Miranda de Brito “atua na promoção da viola de dez cordas como instrumento de pontes culturais, produzindo conteúdos artísticos e acadêmicos em torno da viola como veículo da música modal”. Além da série Áspero, ele já lançou Três Cordas (2015), com o duo homônimo Três Cordas, e com o duo AL’GAZARR, também em 2015, Sonidos Tradicionaes de Lvgar Ninguno.
Nascido em 1990, Rainer Miranda conheceu seus dons musicais em casa, ouvindo fitas cassetes, discos de vinil, cedês e um pouco de rádio, conforme relatou a Antônio Carlos. “Meus pais sempre tiveram o hábito de ouvir música e pude ouvir muita música instrumental em casa, música andina, orquestras de música regional, alguma coisa de música erudita mais conhecida”, contou. “Também tive meu avô, Benedito Messias Brito, um violonista da música caipira e um divertido contador de causos. Uma parte mágica de minha infância foi ouvi-lo tocar e presenciar as rezas que aconteciam na casa dos meus avós, sempre tinha um pouco de música por perto”.
Em outro trecho da entrevista, Rainer acentuou que teve a infância marcada pela audição da música instrumental andina e latino-americana, mais popular e de fácil acesso à época, pois se encontravam discos e artistas pelas ruas e pequenas lojas de música da região. Ainda criança, curtia grupos como Los Jairas (Ernesto Cavour, Alfredo Dominguez, Gilbert Favre), mas apreciava, também, grupos de heavy metal, Helena Meirelles, Cenair Maicá, Noel Guarany, Jorge Cafrune, Mercedes Sosa, Alfedo Zitarrosa, Eduardo Falú e bandas como Devil Doll, Arcturus, Candlemass, Darkthrone. Na adolescência, graças ao acesso à internet, aproximou-se da “música étnica” (ou “world music”) e se apaixonou pela reconstrução e imaginação musical fora da Europa e da América europeia.
“Nesse momento minhas ideias e inquietações como violeiro caminharam para pontes com outras culturas musicais. Mergulhei na música persa e consequentemente conheci um pouco de música do mundo árabe e do mundo hindu”, disse. “Mestres como Mohamed Reza Lofti, Mohammad-reza Shajarian e Parissa abriram um caminho definitivo para minha incursão na música Persa (…). Essa incursão se tornou um centro de gravidade musical do que gosto e preciso escutar de tempos em tempos, selando um ‘pacto’ da minha imaginação e prática musical com a música modal. A música descomprometida, no bom sentido, com o desenvolvimento da harmonia e da tonalidade.”
O “pacto” também permitiu a Rainer “aproveitar muito mais a música nordestina que me constituía como violeiro: João do Vale, João Bá, alguma coisa da Orquestra Armorial, as trilhas sonoras de Glauber Rocha com Sérgio Ricardo”. Depois, “em meio a tudo isso tive o privilégio de conviver e conhecer grandes violeiros e violeiras, cantadores e contadoras que se misturam em um elo de amizade e influência, tanta gente que acho melhor não citar nominalmente para não me esquecer de alguém”.
Rainer Miranda destacou à Ritmo Melodia que não possui formação musical oficial. Até cogitou, na adolescência, buscar um caminho acadêmico de formação musical, mas a curiosidade por culturas musicais não ocidentais o afastou desse possível caminho. “Acho que a viola, que apareceu cedo na minha vida, provocou um desvio de formação interessante para minha curiosidade musical”, ponderou. “Enveredei assim para as Ciências Sociais e, depois, para a Antropologia”, explicou, informando ser graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Antropologia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), de São Paulo. “Sou um violeiro que se tornou, por acaso da vida, antropólogo e professor.”
O conteúdo integral da entrevista de Rainer Miranda de Brito à Revista Ritmo Melodia pode ser acessado pelo linque https://www.ritmomelodia.mus.br/entrevistas/rainer-miranda/
VIOLA NORDESTINA
Um convite à prática e ao entendimento da viola de dez cordas e da afinação em realejo, além de uma iniciativa para a difusão de um instrumento pensado em território piauiense. Assim é possível definir o livro digital Caderno de uma viola em realejo, elaborado por Rainer em colaboração com a equipe do projeto de extensão VÁRIA – Artes e Violas na Caatinga, que ele coordena. O livro eletrônico foi lançado no ano passado e está disponível para download gratuito a partir do linque do site do projeto que estará ao final desta atualização, em uma iniciativa vinculada ao Colegiado de Antropologia da Univasf.
A produção do material tem origem nas oficinas ministradas pelo VÁRIA para a comunidade de São Raimundo Nonato, com o objetivo de popularizar a viola de dez cordas no Piauí. Originalmente, o produto foi pensado para servir de apoio didático-cultural para as oficinas, mas o conteúdo foi remodelado como uma publicação autônoma. O resultado é um caderno que reúne informações e orientações com base em pesquisas e criações artístico-musicais de Rainer e do projeto VÁRIA, elaborado digitalmente como uma alternativa para a necessidade de distanciamento social diante da pandemia de Covid-19.
O caderno é dividido em oito partes e o conteúdo oferece reflexões sobre o histórico da viola de dez cordas, destacando as características que constituem a viola chamada de “nordestina”, como seus ponteados e a estrutura da cantoria. O livro digital também apresenta a afinação em realejo, um jeito de tocar viola típico do semiárido piauiense, como uma destas características, visando a tornar este estilo próprio do Piauí um integrante da família das violas nordestinas, assim como é reconhecido o modo tocado pelos poetas repentistas. Além disso, a publicação apresenta instruções sobre palheta, arranjos, tablaturas, vídeos complementares e notas do instrumento, ao estilo piauiense, com propostas de exercícios práticos para o aprendizado dos leitores.
De acordo com Brito, a publicação é inédita e significa uma oportunidade para colocar a viola nordestina, com destaque à vertente piauiense, no mapa das violas do Brasil, onde a viola “caipira”, símbolo da música sertaneja de raiz, domina todo o espaço. “Esse é o primeiro material instrucional pensado para uma viola do Nordeste. A metodologia é original e a abordagem pensa a teoria musical em um universo fora da metodologia europeia canônica, mas dentro de um local que se conecta às raízes da nossa música nordestina. Acho que isso é cumprir um pouco o papel de agente cultural que a Universidade pode e deve ter”.
O VÁRIA tem ainda uma série de vídeos e de programas radiofônicos com breves comentários em torno da viola, da música modal nordestina e da música do mundo. Os programas radiofônicos podem ser ouvidos pelo linque https://open.spotify.com/show/0p7AehK8GmnrKvoGU0zVd5.
REVOREDO
O programa Revoredo apresentado pelo maestro e professor José Gustavo Julião de Camargo semanalmente a partir das 17 horas todas às quintas-feiras (com reapresentação a partir das 8 horas, aos sábados) nas emissoras da Rádio USP FM, foi dedicado em 26 de novembro à I Mostra de Violas Instrumentais Nordestinas, promovido dias antes, entre 10 e 15 de novembro de 2020.

O pernambucano Paulo Matricó fez parte da I Mostra de Violas Nordestinas, que Rainer Miranda organizou em novembro de 2020 (Foto: Marcelino Lima)
Organizado por Rainer Miranda Brito, a mostra, on-line, reuniu 15 violeiros da Bahia, da Paraíba, de Pernambuco, do Piauí e do Rio Grande do Norte que falaram sobre suas trajetórias e as perspectivas para a viola nordestina instrumental, todos ligados ao movimento cultural de violeiros do Nordeste: Adelmo Arcoverde, Cássio Nobre, Cristiano Oliveira, Fernandinho Regis, Gabriel Bedeza, Julio Caldas, Hugo Linns, Igor Sá, Keyller Almeida, Laís de Assis, Marcelo Othon, Paulo Matricó, Rainer Miranda, Rodolfo Lopes e Rodrigo Veras. Clique no linque abaixo e ouça o programa na integra!
Clique nos linques abaixo e tenha acesso às gravações e ao livro mencionados nesta atualização.