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Peguei a reta passeia por canções próprias, do filho e clássicos de Ernesto Nazareth, Radamés Gnattali, Severino Araújo, Aldir Blanc, K-Ximbinho, Sivuca, Pixinguinha e Abel Ferreira, entre outros
A escrita musical tradicional foi uma das grandes invenções da humanidade. Se não houvesse a escrita musical, como aprenderíamos uma ópera de Wagner com quatro atos e quatro horas ou mais de duração? Mas se alguém acha que vai interpretar algo baseado apenas na habilidade de ler música e utilizá-la de uma forma absolutamente racional, vai se deparar com um grande equívoco. Tocar as notas de uma forma precisa e correta, matemático Newtoniana falando, pode não retratar a obra original em termos de estilo e suingue.
Ao longo de vários anos, desenvolveram-se formas e linguagens para se tocar as obras de compositores de épocas, contextos e locais diferentes. Na prática você tem um “jeito” que é o resultado das inúmeras interpretações de diversos artistas ao longo dos anos, que acabaram por construir o inconsciente coletivo que nos sugere como tocar Johann Sebastian Bach, Benny Goodman, Chiquinha Gonzaga e Pixinguinha, por exemplo. Se você se guiar apenas pela execução correta de uma partitura, poderá pegar o primeiro movimento da Partita em La Menor de Bach e tocar um baião que faria inveja a Luiz Gonzaga.
No álbum Peguei a Reta, novo projeto do músico e clarinetista Paulo Sérgio Santos, lançado de forma física e digital nas plataformas de streaming pela Produtora e Gravadora Kuarup, encontra-se um natural e despretensioso objetivo quase inconsciente por parte dos músicos de interpretar os diferentes estilos de música brasileira, influenciado, de certa maneira pelo folclore, pela história de um país e por sua gente. Esse fenômeno ocorre com o jazz, o choro, o baião, a valsa, o caboclinho, o maracatu, a toada, a música caipira, o samba de breque e as inúmeras manifestações de música brasileira. O mesmo ocorre com a música latina com suas mais variadas formas como a salsa, o tango ou a valsa venezuelana e com o Klezmer, que não se assemelha em nada que se toque na América do Sul, na América Central e na do Norte.
O MENINO DA GAITA
Paulo Sérgio Santos começou a tocar aos 4 anos de idade, quando pegou uma harmônica (gaita) de seu pai e tirou alguns hinos da igreja em Madureira na qual foi criado. Continuou tocando intuitivamente sem nenhum estudo formal nos anos subsequentes. Aos 11 anos, resolveu estudar com o maestro da banda da igreja, Moisés Gomes. Estudou um ano e meio de solfejo e matérias teóricas e ganhou do regente uma clarineta de 13 chaves para que tocasse na banda da igreja. Ali conheceu um clarinetista que se chamava José da Silva Freitas e que tocava exuberantemente. De imediato, tornou-se um ídolo para o jovem músico já interessadíssimo por música erudita. Por sugestão do próprio José de Freitas, passou a estudar com o professor José Botelho, ainda um ícone da clarineta no Brasil, hoje com 90 anos de idade.
Por indicação do Professor Botelho, Paulo se juntou ao Quinteto Villa-Lobos. Abel Ferreira [não confundir com o técnico de futebol português homônimo] assistiu a uma das apresentações do jovem clarinetista e o indicou como o seu sucessor em um programa de televisão em cadeia nacional. Por volta de 1975, entrou para a então recém-fundada Orquestra Sinfônica da Universidade Gama-Filho, cujo diretor era o maestro Isaac Karabtchevsky. Assim, com aproximadamente 16 anos, começou a tocar o repertório orquestral e de câmara e aos 18 assumiu o posto de primeiro clarinetista da Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal da cidade do Rio de Janeiro.
Paulo Sérgio tocou saxofone profissionalmente com 15 dias de estudo na Orquestra Filarmônica Mundial, que realizou um concerto na cidade do Rio de Janeiro sob a regência de Lorin Maazel, em 1985. Em 1994, gravou dois álbuns importantes: O Trio, registrado em Paris, em parceria com Maurício Carrilho e Pedro Amorim e ganhou dois prêmios como Melhor Álbum Instrumental e Melhor Grupo instrumental. Segura Ele foi seu primeiro disco solo, com as participações dos músicos Marco Suzano, Tuti Moreno e Raphael Rabello. Este trabalho ganhou o prêmio Revelação. Logo em seguida, saíram os discos 35 Anos de Música Brasileira. Fronteiras e Quinteto Villa-Lobos Convida.
Em 2001, gravou seu segundo álbum solo, pela gravadora Kuarup, Gargalhada, com participações de Caio Márcio Santos e Bolão, na bateria e na percussão. O trabalho já trazia algumas músicas de sua autoria como Homenagem ao Abel, Samba Chorado e Choro Sambado; com o Quinteto Villa-Lobos registrou em um álbum duplo toda a obra de câmara do maestro Heitor Villa-Lobos, que continha instrumentos de sopro. Este trabalho, de 2005, foi indicado para o Prêmio Caras.
Em 2006 saiu Um Sopro Novo, com patrocínio da Petrobras, pelo selo Rádio Mec. Em 2007, mais álbum duplo, com quintetos originais de compositores veteranos nascidos entre 1926 a 1974. Sua parceria com Guinga merece destaque, pois ele participou de todos os discos de Paulo Sérgio, com exceção do primeiro. No seu álbum Casa de Vila, fez um arranjo para oito vozes e tocou todas as clarinetas e saxofones.
Um exemplar de Peguei a Reta foi enviado ao Barulho d’água Música pela Kuarup, à qual agradecemos em nome de seu diretor Rodolfo Zanke. O disco abriu as audições dos sábados pela manha aqui na redação, em São Roque (SP), neste dia 28.
SUINGUE SEM SOTAQUE
Swing é balanço em inglês. Balanço de praça, de corpo e também de ritmo. Com o ritmo, o swing cristalizou-se como um dos elementos mais importantes do tocar bem. Tocar ou cantar com suingue – e eis que o termo se abrasileira – – é poder se liberar do tempo forte da música, É poder improvisar flutuando ritmicamente. Originário do jazz dos anos 30/40, o termo suingue se universalizou e pode rolar até na música clássica, onde a rigidez da partitura não impede que o grande intérprete dance com os braços, dedos, sopros…
Paulo Sergio Santos tem formação erudita e alma de chorão. Nasceu suingado. Atua em duas das áreas tecnicamente mais difíceis da musica. É herdeiro de grandes clarinetistas, principalmente Abel Ferreira, mas também K–Ximbinho e Severino Araújo.
Neste Peguei a Reta, Paulo Sérgio mostra que é a síntese de todos esses “maiores“. Faz ima geleia geral da estética do instrumento, onde o suingue de hoje convive com a malemolência de sempre. Como já superou as barreiras técnicas, pode criar à vontade.
Tive a sorte de trabalhar com ele e com Abel. Produzi quatro álbuns do Paulo (três para a Kuarup, e um CD/DVD junto com o Guinga). No primeiro, Segura ele, de 1995, tocava seis instrumentos: clarineta, clarone, requinta e saxes soprano, alto e barítono, muitas vezes dobrando várias vozes da clarineta. A famosa (nos estúdios) PSS Orquestra.
Criado no subúrbio carioca, Paulo Sérgio despontou cedo, caminhou entre a roda de choro e a orquestra sinfônica, entremeando com os estúdios de gravação, os palcos da música popular e com o Quinteto Villa Lobos, sua ligação mais permanente com a música de câmara. Em 1986, integrou a Orquestra Filarmônica Mundial, regida por Lorin Maazel.
Ou seja, é fera em qualquer ambiente. Tecando Strawinsky a capela. Dançando numa gafieira. Duetando com Paquito d’Rivera ou Paulo Moura. Improvisando com a turma Cazes- Radamés. Arrasando em festivais na Europa. Fazendo roda com Joel Nascimento. Pontos altos. Alguns.
Em 2001, gravamos seu segundo CD – Gargalhada — no mesmo estúdio do Sérgio Lima Netto onde agora fizemos esse Peguei a Reta. Araras, Petrópolis. Estreia do seu trio com Caio Márcio – o filho violonista – e o baterista Oscar Bolão, sucessor de Luciano Perroni (Quinteto Radamés Gnatalli).
Peguei a Reta é herdeiro direto de tudo isso. Do trio do disco anterior (mais Drago Zangado, aluno do Balão e neto do Perroni). É herdeiro do menino caçula do Quinteto Villa Lobos. Dos improvisos únicos, sobretudo de seu inteiro à vontade em qualquer estilo.
Ao pegar esta reta, Paulo Sérgio ousou abrir com o clássico Apanhei-te Cavaquinho para depois enveredar por uma mescla do novo com o consagrado, sempre acrescentando seu toque único Reviveu Teclas Pretas. Desencavou um Pixinguinha raro é rearranjou outro. Mostrou os lados forró e choro de Sivuca, sem se esquecer do Radamés e do Guinga.
Gravou um samba dele mesmo e um baião moderno de Caio. Trouxe de volta Porfírio, K-Ximbinho e Severino. E de brinde fez mais uma homenagem (a capela) a Abel Ferreira.
Paulo Sérgio Santos. Virtuose. Poliglota. Maduro. Sem sotaque. Com suingue. Com vocês.
Mário de Aratanha (Araras, Petrópolis, 2020).
PEGUEI A RETA FAIXA A FAIXA
Na primeira faixa do disco, Apanhei-te Cavaquinho, foi preservado o estilo inconfundível de Ernesto Nazareth, amado por Villa-Lobos, com uma parte B bastante complexa em termos de sincronia dos dedos mínimos e finalizando coma primeira parte sendo tocada num andamento muito acelerado, com a intenção de atrair o ouvinte pelo caminho do virtuosismo.
A segunda canção, intitulada Remexendo, mostra um Radamés Gnatalli com muito suingue e totalmente em sincronia com o título da obra. Um músico excepcional, de formação erudita que descobriu a música popular brasileira, apaixonou-se por ela e contribuiu com sutilezas de grande expressividade.
Teclas Pretas, a terceira música, tem esse nome porque se a composição for tocada em um instrumento de teclado como uma escaleta, piano, cravo, sintetizador etc se faz o uso das teclas pretas e não das brancas.
Eu Quero é Sossego, de K-Ximbinho e Hianto de Almeida, quarta faixa, mostra um lado extremamente expressivo, doce e de um gosto harmônico muito especial.
Um Chorinho Em Aldeia, a quinta melodia, mostra a composição do músico Severino Araújo, o rei dos bailes, irmão de Zé Bodega, um dos maiores saxofonistas, clarinetistas e improvisadores brasileiros de todos os tempos. Severino Araújo tocava e regia a sua famosa Orquestra Tabajara – muito influenciada pelas big bands norte-americanas.
Terra Seca, a sexta faixa, é uma música de autoria de Caio Márcio Santos, filho de Paulo Sérgio Santos, que traz uma influência nordestina.
Luar de Coromandel, sétima faixa, foi gravada em homenagem ao grande clarinetista Abel Ferreira que, em sua notável generosidade, indicou Paulo Sérgio Santos como seu sucessor no choro em um programa de televisão quando Paulo Sérgio ganhou o Concurso de Jovens Concertistas, lá pelos seus 16 anos. Foi Abel um incentivador ou um profeta?
Samba da Lua é a oitava faixa. Paulo Sérgio Santos a escreveu em um voo entre Roma e Lisboa e levou esse nome devido a uma belíssima lua cheia que pairava no céu naquela noite durante o trajeto.
Cheio de Dedos, nona faixa, é de autoria do Guinga que, para Paulo e muitos artistas, é um verdadeiro marco na música brasileira. O clarinetista teve a honra de viajar mundo afora com o músico carioca virtuoso sempre cativando o público com a sua genialidade e força de sua musica.
Cheguei e Seu Lourenço no Vinho décima e décima segundas faixas, foram dedicadas a Pixinguinha, ícone do choro em um arranjo primoroso e ousado de Caio Márcio Santos, talentoso filho de Paulo, feito para três clarinetas, violão, bateria e percussão. Dois clássicos do mestre.
As duas últimas faixas são de Sivuca, com quem Paulo tocou. Sivuca divide a autoria com a esposa, Glorinha Gadelha. A música Dino Pintando o Sete é e dedicada ao violonista de 7 cordas Dino, do Conjunto Época de Ouro, no qual tocou e praticamente viveu Jacob Bittencourt. Dino influenciou muita gente, como Raphael Rabello, Tony 7 cordas, até mesmo Camarero, o atual 7 cordas do conjunto. Cabaceira Mon Amour (Cheirinho de Mulher) é um baião inspirado que deu asas à imaginação coletiva propiciando um clima favorável à improvisação que fecha o álbum.
BADEN POWELL, RENATO TEIXEIRA, NEY MATOGROSSO.…
Especializada em música brasileira de alta qualidade, o acervo da produtora e gravadora Kuarup concentra a maior coleção de Villa-Lobos em catálogo no país, além dos principais e mais importantes trabalhos de choro, música nordestina, caipira e sertaneja, MPB, samba e música instrumental em geral, com artistas como Baden Powell, Renato Teixeira, Ney Matogrosso, Wagner Tiso, Rolando Boldrin, Paulo Moura, Raphael Rabello, Geraldo Azevedo, Vital Farias, Elomar, Pena Branca & Xavantinho e Arthur Moreira Lima, entre outros.
Além desta eclética galeria de cantores e duplas cujos trabalhos já lançados formam o acervo de álbuns, também é possível ao internauta que visita o portal da Kuarup, entre outras atividades no campo da produção cultural, saber pela guia Notícias as novidades que estão chegando para reforçar este precioso catálogo e, ainda, ouvir 52 seleções de músicas disponíveis na plataforma Spotify (playlists) apresentadas por temas e recortes dos mais diversificados, revelando a riqueza de sonoridades e de gêneros que a empresa guarda. Uma das preferidas aqui na redação do Barulho d’água é Nova Geração Kuarup (clique no nome da lista para ouvi-la).
“O álbum foi lançado pela primeira vez em 1984, no Rio de Janeiro, e é o fruto do encontro feliz entre diversos músicos, cantores, instrumentistas, compositores e técnicos de gravação. Alguns deles já tinham a carreira musical consolidada, outros, apenas iniciada e outros ainda, como eu, estavam começando.
Lançamos mil discos (1.000) em uma produção independente, em 1984, e mais tarde, em 1990, mais 500 cópias em formato de CD, e nada mais. Nada Más! Porém, passados 35 anos, acredito que ele ainda seja um dos meus discos mais conhecidos. E que prazer poder dizer pra vocês que meu primeiro disco está nas plataformas”.
Clara Sandroni
Kuarup Música, Rádio e TV
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Rodolfo Zanke rodolfo@kuarup.com.br