1433 – Cantor, compositor, violeiro ativista de causas ambientais e humanistas: Josino Medina (MG) é sertanejo plural com alma de vaqueiro roseano

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O disco Quadras do Sertão – A história do vaqueiro Sebastião Eugênio foi recentemente enviado à redação do Barulho d’água Música, aqui em São Roque, Interior paulista, pelo seu autor, o mineiro nascido em Carlos Chagas Josino Medina. O álbum constitui um trabalho essencial à memória cultural brasileira para dele se dizer o mínimo. Lançado em 2016 após uma bem-sucedida vaquinha virtual, com pesquisa, adaptação e gravação do próprio Medina — que toca viola caipira nas 16 “faixas”, apresentadas como “Cenas” –, Quadras do Sertão… reúnem quadrinhas recolhidas da obra de João Guimarães Rosa e parte de vaqueiros dos vales do Rio São Francisco como Manoel Ferreira, Seo Erotides (da Vila dos Gaúchos, Grande Sertão Veredas) e Manoelzão, na região do município de São Francisco (MG), e por Valdomiro Francisco Medina, pai do Josino. Aboios, contradanças, ABC e coco voltado compõem o repertório cantado entre narrativas, tudo masterizado no Estúdio Lira por Bilora e gravado por Gustavo Guimarães, dois dos mais proeminentes violeiros e produtores culturais conterrâneos de Medina. Guimarães também assina o encarte, ilustrado por desenhos de Clarissa Magalhães.

A jornalista Rita Simone, autora do texto que fez parte da campanha para arrecadar fundos para a gravação do álbum, descreveu Josino Medina como “um plural do sertão. Um sertanejo plural”. Em suas palavras que a partir daqui transcreveremos para melhor apresentá-lo, “esta é uma definição clara para se falar do artista multifacetado” Josino Medina. Filho de vaqueiro do Vale do Mucuri, poeta, cantor, compositor e fervoroso militante das questões ambientais. “Josino é uma daquelas raras figuras que passeiam pelo cerrado brasileiro, como se ele mesmo se transmutasse em um elemento da flora, tamanha é sua intimidade com a natureza”. Destacando a atuação dele como combativo ativista de causas ambientais, ela observou: “Ele já militou na floresta Amazônica, trabalhou em montanhas ambientais alternativas, foi embaixador da lua, trilhou os caminhos do [Guimarães] Rosa, aportou nas ondas do rádio no interior de Minas, fez cantorias, brincou de interpretar a si mesmo criando uma série de quadrinhas sobre o personagem que vive em sua alma: o vaqueiro.”

Josino Medina, retratado pelo artista plástico mineiro Gildásio Jardim

Rita Simone ainda apontou que Josino dispensou boa parte da própria juventude a trabalhar como padeiro, a madrugar no preparo de pães, bolos e tortas para alimentar o dia a dia de milhares de sertanejos. “Este, claramente, não foi um tempo de hiato artístico. Pelo contrário. Seu poema ‘Receita de pão caseiro‘ é prova disso. Nele, Josino nos fala de tolerância, respeito à diversidade, amor mesmo, sentimento que este artista exala quando seus cabelos de Antônio Conselheiro são atingidos pelos ventos do sertão”. Josino tem o dom de magnetizar as crianças que têm a oportunidade de encontrá-lo e é um educador por excelência, “daqueles que só existem em espaços cultivados por gente como Paulo Freire: o espaço Brasil. É impossível não se notar o Medina.”

Josino Medina, ainda segundo a jornalista, veste-se de branco, tem um tom de voz brando ao falar e carrega consigo uma viola, um tambor feito por seu João Mocó e uma rabeca. “Seu boizinho sempre está à espera de uma nova brincadeira e seu peito aberto para as lutas por uma causa justa, como a promoção da alimentação como um direito humano”. Em um projeto de Segurança Alimentar e Nutricional realizado em assentamentos e acampamentos de reforma agrária, Josino gravou um álbum no qual brada a importância de que “um prato cheio em toda mesa, seja esta nossa certeza”.

O cantor e compositor, elogiado por Simone como “um brincante por natureza e uma alma orgânica por excelência”, aprecia cantar com as lavadeiras, as crianças da Aldeia Cinta Vermelha-Jundiba, os batuqueiros de Araçuaí e pelos palcos do Brasil já acompanhou parceiros, entre os quais a autora do texto citou o saudoso Dércio Marques, além de Carlos Brandão, Pereira da Viola e Paulim Amorim. Quem o conhece e o admira, “sabe que este é um indivíduo que não se rendeu à globalização. Ele é um ator local extremamente criativo e uma confirmação de que a identidade brasileira caminha a passos firmes e fala por vozes mansas e aboios da alma.

Josino Medina, ao centro, entre amigos como Pereira da Viola, de azul, e Dércio Marques, com o violão (Foto: Acervo de Josino Medina)

Carlos Chagas, berço de Josino Medina, está situada no Vale do Mucuri, em Minas Gerais. Outro texto que utilizamos como referência, publicado em 23/07/2020 no sítio virtual Arte em Trânsito, informa que na década dos anos 1980, ao participar de festivais em sua cidade, Josino Medina tomou gosto pela composição e conheceu o também violeiro, cantor e compositor Pereira da Viola, com quem iniciou pesquisas de cantigas e brinquedos na Comunidade Quilombola de São Julião, Minas Gerais; segundo Josino, os pais de Pereira da Viola (mãe Augusta e João Preto) foram os principais informantes dessa pesquisa. São dessa época suas composições Menina Flor, Margarida, Cantiga das 4 Luas e Cirandinha. Margarida é uma homenagem à sindicalista e defensora dos direitos humanos , assassinada em Alagoa Grande (PB) em 12 de agosto de 1983. Margarida Maria Alves foi uma das primeiras mulheres a exercer um cargo de direção sindical no país. Seu nome e sua história de luta inspiraram a Marcha das Margaridas, que foi criada em 2000.

Depois, na década seguinte, nos anos 1990, em Ji-Paraná (RO), onde morou entre 1991 e 1993, Josino assinou a trilha sonora para a peça Onde tem bruxa, tem fada, participou da Sala do Menino Maluquinho trabalhando com a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e aprofundou sua atuação como educador juntamente com crianças e brincantes tais quais Adelsin, Doroty Marques e Dércio Marques. Escreveu músicas como Tawaraná, Enquanto Um Verso Vira Vida, Tear, Lembretes de Hudson, O Sopro do Vento, entre outras e, em 1993, ao voltar para Minas Gerais, retomou o trabalho com Pereira da Viola, com quem se apresentou em várias cidades do estado mineiro.

Nos Encontros Populares de Cultura, Josino conheceu o antropólogo e educador Carlos Rodrigues Brandão, com o qual teceu parcerias para musicar as poesias do amigo. Deste trabalho, nasceram os álbuns O jardim de todos; Os nomes; Furundum: canções e cores de carinho com a vida. Josino também musicou poemas da gaúcha Sônia Anja. Josino fez parte do grupo Embaixadores da Lua, com Paulim Amorim e Keila, com os quais. montou o espetáculo Histórias e Cantigas do Reino de Deva e excursionou por algumas cidades do Norte do país e de Minas Gerais. Nessa mesma época, inicia as pesquisas para dar vida às Quadras do Sertão A história do Vaqueiro Sebastião Eugênio.

Autor também de Sumidouro (clique na palavra em negrito e ouça) Josino Medina reside em Araçuaí (MG) desde 1996. Sobre Quadras do Sertão… recorda-se de que enquanto musicava algumas quadrinhas o pai, sêo Valdomiro, relembrava contradanças, abcs e aboios que guardava em sua memória desde quando brincava na infância e na mocidade. Em Araçuai, trabalhou como Arte-Educador do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD) e possui uma pequena fabrica de pífanos, com os quais ensina música a crianças. Homem resiliente como todo camponês, ele chegou a deixar a carreira em segundo plano para cuidar de uma filha especial. Em uma de suas músicas, Caminho das águas, composta em parceria com Frei Chico (fundador do Coral Trovadores do Vale), ao mesmo tempo em que homenageou o Rio São Francisco, ele registrou em seus versos a dimensão da fé pela qual os povos sertanejos se guiam Brasil adentro:

Rio abaixo, rio acima/Numa barca enfeitada/Um pouco com Deus é muito/E muito sem Deus é nada.

“Tenho profundo respeito por Josino e sua caminhada. Ele é compositor refinado, tem um trabalho lindo junto ao Pereira da Viola, com o qual gravou muita música boa no início da sua trajetória, mas recentemente passou por momentos delicados devido a problemas pessoas e familiares e deixou a carreira m segundo plano”, disse Wilson Dias, também cantor e compositor mineiro. Dias é um dos companheiros de estrada que tem se esforçado para valorizar a obra de Medina e, para trazê-lo de volta à cena artística, em 18 de abril o convidou para se apresentar como uma das atrações do projeto Viola de Feira, ao lado de Jéssica Soares, Gustavo Guimarães, Felipe Dias e Ivan Vilela. O Viola de Feira é uma iniciativa da Picuá Produções Artísticas, que tem à frente a esposa de Dias, Nilce Gomes, e nesta temporada promoveu quatro rodadas de concertos virtuais com violeiros consagrados, apoiada pelo Ministério do Turismo e do Governo do Estado de Minas Gerais, contemplado pelo Edital da Lei Aldir Blanc (Edital Nº 16/2020 processo nº 1397).

Além de Wilson Dias, Josino Medina cultiva entre seus admiradores Nádia Campos, cantadeira, música, compositora, pesquisadora, educadora cantautora e arte-educadora, autora do texto abaixo:

Josino Medina é um compositor, brincante, poeta da rua e do povo!

Tem a capacidade de encantar com sua violinha na mão, captando os sonhos mais singelos dos povos, dos peixes, dos rios. E por serem tão singelos são como os diamantes raros. São sonhos de ser livre; de ser gente; de ser semente, planta e fruto; de ser hermanamente vivo, coexistindo com tudo em harmonia.

Lembro-me de ver Josino com sua viola, tocando e aglutinando pessoas que saíam de suas casas e iam atrás do cantador, sem saber onde iam parar. Nas ruas de Morro do Garça, cidade em que nasceu minha bisavó, repleta da magia literária de Guimarães Rosa, Josino se comunicava através do olhar límpido e da música.

Nas beiras do velho Chico em Pirapora, Josino cantava, tocava e comunicava-se com o rio. Do rio ele aprendia, para o rio ele cantava…

Uma vez tive a alegria de poder acompanhá-lo em uma viagem ao alto do Caparaó na divisa de Minas Gerais com Espírito Santo. Cantamos na rádio, fizemos roda, fomos às escolas, cantar e brincar com as crianças. Sempre me recordo da cena de estarmos voltando da rádio para a casa dos amigos Lúcio e Farinhada e no caminho encontrarmos crianças nas ruas. Não sei dizer bem se fomos nós quem levou as crianças para o universo musical ou se foram elas que nos levaram para seu mundo mágico, encantado, com olhar de eterna curiosidade sob as coisas do mundo!”

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