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O Barulho d’água Música retoma com esta atualização dedicada a Paula de Paula a série que busca a valorização das violeiras do Brasil e que já publicou os perfis de Cláudia Moraes e Letícia Leal, ambas mineiras, e da pernambucana Laís de Assis. Viola e sanfona são os principais instrumentos, musicais e políticos, da cantautora, multiartista e multi-instrumentista que alia sua carreira musical ao trabalho docente de arte-educadora e estabelece por meio do regionalismo da cultura sertaneja e caipira os pontos de partida para suas criações artísticas. O trabalho docente, além de ter reflexo em suas composições, colabora para a manutenção de sua vida artística.
Nascida e criada em Goiânia, capital de Goiás, Paula de Paula é o nome artístico de Paula Lopes de Paula Briguiza, artista que traz na personalidade de suas canções forte influência da música caipira mesclada a outros ritmos populares brasileiros como xote, baião, maracatu, bumba meu boi e, ainda folk, country e blues, expressando um estilo diverso de composições e de arranjos. Em sua infância, por intermédio do pai, teve contato com instrumentos musicais e a trajetória da família do campo para a cidade permitiu que, além dos instrumentos acústicos, a eletricidade das guitarras e dos contrabaixos também encantasse a então criança. Paula, por sinal, já naquela fase da vida jamais largava seu “caderninho” que usava para rabiscar as letras que, anos depois, viriam a se transformar em suas composições.
A chispa não tardou a cintilar com mais força. Aos 15 anos, Paula de Paula já tinha intimidade com o violão e, aos 18, migrou para a viola caipira. Nesta época, aluna de faculdade de artes cênicas, começou a compor e participar de festivais. Com Canarinho Cantador, sua primeira música de trabalho, saiu campeã de um festival em Anápolis (GO) e, mais do que o prêmio pelo título (uma motocicleta!), ganhou o apoio da família à carreira artística. A mesma música lhe garantiu o segundo lugar do festival SESC Canta Cerrado (2012). Depois, Paula de Paula participou de programas de televisão que abarcam o universo das culturas tradicionais como Frutos da Terra (TV Anhanguera/2012) e Viola Minha Viola (TV Cultura/2015), eternizado pela rainha e pesquisadora da cultura caipira, Inezita Barroso. Foi assim abriu novas veredas pelo cenário da viola caipira em outros estados, como Espírito Santo e Minas Gerais.
Ainda no ambiente de efervescência cultural da universidade, Paula de Paula encontrou parceiros que a ajudaram a construir sua carreira. Além de se apresentar com o grupo feminino Batuque de Roda Meus Amô, entrou para a banda Erotori, que lançou o primeiro álbum O amor, a Paz e o Pão em 2019 (clique no nome da banda e ouça as faixas). Antes, em 2018, ela e a instrumentista e compositora Flávia Carolina, com a qual forma o duo homônimo ao disco, gravaram Ave Eva.
EROTORI E AVE EVA

Flávia Carolina e Paula de Paula formam o Ave Eva
É notável o fato de que, além de estar presente em múltiplos projetos, característica dos artistas do cenário independente – inclusa a atuação enquanto professora e arte-educadora –, os trabalhos que Paula de Paula integra trazem sempre a assinatura da viola, da sanfona e do cantar sertanejo. Em Erotori, banda à qual se somam a cantautora, Noel Carvalho (bateria), Emanuel Leal (baixo), Daniel Pregnolatto (guitarra), Rozinaldo Miranda (sax tenor) e Marcos Galvel (teclado), esta marca é visível na mistura entre elementos tradicionais e modernos. Os sons característicos da viola caipira, dos ritmos do sertão, do Cerrado e do interior dialogam com as guitarras, os teclados e os efeitos sonoros da Capital, trazendo inventividade para as composições, o que pode ser percebido na faixa Pipoca Doce, por exemplo.
O álbum Ave Eva, por sua vez, evidencia de forma ainda mais proeminente os ritmos e aspectos sonoros característicos do estado de Goiás, da vivência interiorana do Cerrado brasileiro, ainda que com uma roupagem atualizada e nada conservadora. A decisão de traçar esse caminho estético e sonoro veio, além das influências da trajetória pessoal, da afirmação de identidade: “Com o passar do tempo, por meio de minhas composições, vi que realmente é uma forma de me afirmar nessa cultura goiana e de reconhecer a beleza disso; de vivenciar as folias, de me encantar com a sanfona, com a viola; e de perceber toda a memória afetiva que esses instrumentos trazem, não só pra Goiás, mas pro Brasil todo”, relatou Paula de Paula ao jornalista Pedro Constantino, do blogue Conteúdo.Som.VC
O sentido político da sua atuação artística deixa clara a intenção de ocupar um cenário majoritariamente composto por homens. As escolhas da viola e da sanfona são também decisivas para essa postura. “Eu acho muito legal estar representando estes instrumentos sendo mulher nesse contexto da música caipira, onde há predominância de homens tocando viola e sanfona. É um lugar no qual gosto de estudar e de me expressar; extravasar o feminino e minha arte por intermédio deles.”
Desse modo, integrar projetos compostos só por mulheres é um reforço para o aumento da presença feminina no meio musical, o que vai além de uma possibilidade de construção de narrativa da mulher empoderada, pois coloca em foco o próprio eu lírico feminino e possibilita que todas as facetas da música e da poesia partam do ponto de vista específico das mulheres: “É realmente o eu-lírico feminino nas músicas. O enredo que parte de uma mulher que está contando a história. Então, não são só as letras estão diretamente me colocando nesse lugar de empoderada, mas a minha poesia, independentemente do que ela esteja falando, eu estou falando, é um lugar de fala do feminino, da mulher”.
Paula de Paula reconhece que, apesar de recente, a presença feminina no sertanejo ganha cada vez mais força, inclusive no mainstream e no que ficou conhecido como “feminejo” com cantoras como Marília Mendonça, por exemplo. Pensando nisso, durante a quarentena provocada pela pandemia da Covid-19, foi que ela se juntou a Cláudia, Letícia e Laís entre outras violeiras para mapear e tornar visível o trabalho das violeiras do Brasil. Por meio das redes sociais, elas começaram um processo de cadastro de violeiras e ficaram felizmente surpresas com o resultado. O endereço para mais informações é https://violeirasdobrasil.wordpress.com/

Paula de Paula com Inezita Barroso: violeira goiana busca maior reconhecimento e valorização do trabalho das mulheres no universo do instrumento, assim como fez a Rainha Caipira
Apesar de distante dos palcos, como tantos outros artistas nesta época na qual está proibida a reunião de pessoas e se impõe o isolamento doméstico, Paula de Paula seguiu focada na produção e no desenvolvimento de seus múltiplos trabalhos e empenhou-se na realização de dois projetos, um deles já finalizado e disponível nas plataformas digitais: o disco infantil e primeiro álbum solo Meninada Encantada, com a produção de Pedro Laba, inspirado pela maternidade e pela vivência de arte-educadora. O álbum tem oito composições que perpassam os ritmos populares como xote maracatu, baião e outros e conta um coro de alunos da Escola do Sertão, local onde trabalhou como docente.
DISCO SOLO
Paula de Paula também deverá lançar ainda neste ano seu disco solo, Violeira. Com ele, consumará o sonho construído desde criança, época em que já havia definido a estética caipira do disco. Produzidas em conjunto com Pedro Vaz, violeiro que participará em faixa instrumental do álbum, as dez músicas estão em processo de gravação. Os traços sonoros da compositora aparecerão com mais força neste trabalho, que inclui guarânias e demais ritmos marcadamente sertanejos. As também violeiras Marina Ebbecke, Letícia Leal e Sol Bueno participarão do álbum a caminho.
Paralelamente à carreira solo, Paula de Paula já desenvolveu diversos projetos em parceria com outros músicos como: Encontro Violado, Batuque de roda Meus Amô, Na Asa do vento, interpretando viola caipira e acordeon. Atualmente, além da Banda Erotori e da dupla Ave Eva, também compõe o trio Forró das Muié, atuante na Chapada dos Veadeiros (GO).