1628 – Gaúcho e universal, novo disco de Bebê Kramer chega às plataformas digitais*

* Com Lilian Macedo e Leonardo Lichote

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Acordeonista de Vacaria convocou um time de conterrâneos para uma alegre celebração de suas raízes do Sul e diálogos para além das divisas regionais que vão do xote de Dominguinhos ao samba rock de Jorge Ben Jor

Gauchada reunida, álbum instrumental do gaúcho Bebê Kramer, já está disponível para audição nas plataformas digitais com a proposta de ser uma celebração do Rio Grande do Sul, mas de vocação universal como a música do acordeonista. Não à toa, Kramer convidou um time de conterrâneos que, de diferentes maneiras, dão robustez à árvore da música do Sul. Uns, na expansão dos galhos em mil direções, como Pedro Franco (violão 7 cordas) e Guto Wirtti (contrabaixo), além do próprio anfitrião. Outros, na firmeza das raízes, caso dos irmãos Paulinho Fagundes (violão 6 cordas) e Ernesto Fagundes (bombo legüero). O autor observa que o disco lembra os finais de semana em família, em Vacaria, onde nasceu: “Sexta-feira, no meio da tarde, a gente já começava a botar a carne no fogo, a gaita (como o acordeon é conhecido no Sul) pegando… E íamos até domingo, com o último arroz de carreteiro feito com o que tinha sobrado da carne”, disse. Promovia-se um “festerê”.

Kramer afirmou que o projeto consuma uma onda musical que está tentando desenvolver há anos porque a música gaúcha tem caráter mais fechado, de menos comunicação com o resto do Brasil. Músicos como eu, Yamandu (Costa), Guto (Wirtti), a gente tem buscado a responsabilidade de fazer uma música gaúcha mais aberta”, explicou. “Tenho tentado isso nos últimos discos”.

O álbum carrega esse desejo de comunicação já na origem das composições. Bebê Kramer escolheu reunir em Gauchada reunida uma leva de músicas em sua maioria feita no violão. “Como tenho muitas limitações no instrumento, acabam saindo coisas mais cancioneiras, melodias mais cantáveis”, disse, antes de emendar: “É o que componho depois das 22 horas, quando não posso mais tocar acordeon pra não incomodar os vizinhos e ligo meu lado Bossa nova, mais mansinho.”

Bossa nova é força de expressão, claro. O bombo lagüero, a marcação do baixo, o sotaque gaiteiro e a conversa dos violões garantem o vigor e a assinatura gaúcha, longe do banquinho e da orla carioca. Mas é perceptível o que Kramer chama de “lado mais mansinho” em faixas como Agosto, que define como um “xote gaúcho”, que vai do tom melancólico de lamento nordestino de um Dominguinhos até um “festerê” de Vacaria. Ou ainda em Imensidão, que assim como a faixa-título, é uma das poucas do disco composta no acordeon. “Mas parece que foi feita no violão, pois traz paz pro coração, um mar pela frente, um horizonte. Sou apaixonado por essa música.” O lirismo da conversa dos violões nos solos coroa a beleza da melodia.

Amizade também carrega também essa serenidade, uma espécie de melancolia pacificada, solar. Kramer contou que a letra que Iara Ferreira escreveu para a melodia (gravada no disco em versão instrumental) capta exatamente esse sentimento: “Ela fala de uma história de amizade. Como se fosse eu com saudade do meu amigo Gabriel Grossi, que não via há muito tempo por conta de nossos trabalhos, mas que estava presente no dia em que fiz a música.” A escolha pelo Sul ensolarado, leve, alegre é reafirmada em Chama a Rita — já no título, um trocadilho com a dança/ritmo argentino chimarrita (ou chamarrita). Com sua levada solta com algo de rock (que faz pensar que a Rita pudesse ser a Lee), ela tem “um quê de tertúlia, de sarau”, nas palavras de Kramer. Nada é mais festivo, porém, do que Gauchada reunida, um vanerão. “Diferentemente de outros gêneros, como a chacarera e o chamamé, vindos de países vizinhos, o vanerão é legitimamente gaúcho. É a síntese da festa gaúcha”.

Outra que se entrega já no título é Um samba como esse tão legal, que faz referência ao verso de Mas que nada, clássico de Jorge Ben Jor e que nasceu de uma levada de violão simples que ganha um caráter original com o toque do bombo lagüero e os caminhos do acordeon. Composta por Bebê para sua irmã, Fabi registra um outro momento do compositor, em seus caminhos harmônicos mais intrincados. Apesar da sinuosidade, sua melodia também tem a sedução de canção, do convite ao canto. “Eu estava muito próximo da música de Toninho Horta, dos mineiros. Hoje minhas músicas estão mais simplificadas, mas adoro Fabi, acho linda.” Também mais densa do que o espírito geral do disco, apesar de conversar bem com ele, Tempestade visita outro lado da tradição musical gaúcha. De cara, estabelece a tensão sugerida no título, das nuvens se fechando no horizonte. O ritmo enérgico (um aire de chacarera, explicou Bebê) estabelece uma coesão em meio a seu movimento algo caótico. E enriquece a dinâmica do álbum.

As nuvens negras de Gauchada reunida, porém, são passageiras — e mesmo elas carregam uma vibração que inspiram o desejo de se projetar para fora, que atravessa o disco. Don Euclides, composta por Bebê Kramer, Paulinho Fagundes e Ernesto Fagundes, é exemplo desse desejo: é uma milonga nervosa, feita em homenagem a Euclides Fagundes, pai dos parceiros do acordeonista. “Sou fã da família, muito tradicional na música gaúcha”.

Como o “festerê” é aberto, o disco inclui duas músicas que não foram compostas por Bebê. Black pantha, de Pedro Franco, parte da estrutura do aire de chacarera para que o compositor afirme sua originalidade. “Tem essa referência gaúcha, mas harmônica e melodicamente não tem a ver com nada, só com Pedrinho mesmo”, avaliou Bebê. A segunda, Velho Zé, é uma alegre homenagem de Guto Wirtti ao compositor Zé Meneses, autor do tema de abertura de Os Trapalhões. A música traz esse humor e graça nostálgica de uma era da TV romântica, da comunicação direta e quente que está, no fim das contas, na alma de Gauchada reunida. “Gauchada reunida era exatamente o que eu queria fazer hoje. Tive perdas familiares, atravessamos uma pandemia”, lembrou-se Bebê, antes de sintetizar: “Precisamos de leveza”.

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