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Primeiro disco de Canções Para Atravessar a Noite Escura – Canções na Quarentena já chegou às plataformas digitais, com gravações acústicas ao vivo baseadas no repertório dos shows Acalantos
*Com Mercedes Cumaru
Ao completar 28 anos de carreira, a cantora e compositora paulistana Kátya Teixeira fará uma série de ações comemorativas a começar pelo lançamento do primeiro álbum que integra o disco Canções Para Atravessar a Noite Escura | Canções na Quarentena, já disponível nas plataformas digitais. Acústico, o álbum foi gravado ao vivo em estúdio e traz as canções que fizeram parte de Acalantos, apresentação virtual que Kátya protagonizou em março de 2021, com recursos da Lei Aldir Blanc, pelo Proac SP.
“O show Acalantos que deu origem ao CD, contou com a participação de André Venegas e da contadora de histórias Nani Braun. O espetáculo foi realizado dentro de uma proposta artística para o público infanto-juvenil, mas o olhar para o mesmo repertório difere a partir da percepção de cada pessoa. Nas canções presentes nesta obra, pr’além de acalentar pais e filhos, existe a intenção de acessar a nossa criança interior, sobretudo, com todos os acontecimentos dos últimos anos, nos quais estamos lidando com tanta dor e luto, pandemia, questões sociais, ambientais e políticas tão duras. Andamos, de fato, muito carentes de afeto e fé de que isso tudo vai passar. Parafraseando o poeta Thiago de Mello: ‘…faz escuro mas eu canto, porque a manhã já vai chegar’“, escreveu Kátya Teixeira ao detalhar a essência do recente trabalho.
A cantora e compositora paulistana Kátya Teixeira fará três apresentações no Sesc Belenzinho, nos dias 3, 4 e 5 de dezembro, quando protagonizará o espetáculo Violetas e Margaridas. Além de marcar o aguardado reencontro com o público, a cantora ressaltou que esta série de apresentações trará, ainda, outras marcas representativas e significantes tanto na sua carreira de quase três décadas, como no aspecto pessoal para uma mulher, artista, com seus 50 anos de vida recém-completados. A importância desse concerto se expande ainda mais, pois durante as apresentações haverá a gravação, ao vivo, das canções que integrarão o sétimo álbum da artista. “Estar no palco é um momento sublime para mim e quando isso acontece após um hiato forçado de quase dois anos a emoção chega a ser indescritível”, comentou Katya entre os preparativos para o primeiro show presencial após a pandemia de Covid-19.
Cantor e compositor começou a carreira que trocou pela Medicina ainda garoto, no sertão baiano, e depois de brilhar com os revolucionários Novos Baianos, optou pela carreira solo interrompida “na alvorada dos setenta” , enquanto dormia , por um infarto
(…) O sertão, essa vaga ficção geográfica que sempre foge à localização precisa. Pode-se entrar pelo sertão, que sempre haverá um sertão mais para o interior do país.””, Aires da Mata Machado Filho, O negro e o garimpo em Minas Gerais, página 33 (III, Sob o signo do diamante), Editora Itatiaia Limitada, 1985
“Sertão é o sozinho”.
“Sertão: é dentro da gente”. Grande Sertão: Veredas, João Guimarães Rosa, Livraria José Olympio, 1956
O último disco gravado pelo cantor e compositor Moraes Moreira, lançado em 2018, Ser Tão, foi o escolhido para abrirmos neste dia 18 de abril mais uma audição matutina dos sábados pela manhã, cumprindo a determinação de nos mantermos isolados durante a pandemia do coronavírus (Covid-19) aqui no boteco do Barulho d’água Música, em São Roque, cidade do Interior paulista a cerca de 60 quilômetros da cidade de São Paulo.
A morte de Moraes Moreira ocorrida na segunda-feira, 13, de infarto do miocárdio enquanto dormia em sua casa (assim como Belchior, em 2017, e Tunai, mais recentemente) na cidade do Rio de Janeiro, indiscutivelmente deixa mais uma vez de luto a cultura popular, abalando não apenas o universo musical brasileiro, mas como um todo nesta época de pandemônio federal o combalido meio artístico no qual ele despontou nos começo dos anos 1970 como um dos integrantes dos revolucionários Novos Baianos. A passagem ao Plano Maior, entretanto, não apagará a obra grandiosa que nos legou o baiano deItuaçu frequentemente associado a ritmos mais quentes como o frevo, o samba, as marchas de carnaval, o baião, o maracatu e mesmo o rock, mas que recentemente, no auge da maturidade, vinha buscando uma nova identidade que, na verdade, o levava de volta às próprias raízes, o fazia experimentar uma verdadeira “alvorada” aos 70 anos.
Ser Tão é um disco breve, de nove faixas apenas, e saiu pelo Selo Discobertas seis anos após o estrondoso sucesso entre a crítica e o público do álbum antecessor, A Revolta dos Ritmos — o que, talvez, não tenha rendido à empreitada os devidos elogios que Moraes esperava. Mais afeito à poesia e à lapidação da palavra nos últimos dias, Moraes Moreira à la Patativa de Assaré, Zé Limeira e Cego Aderaldo vinha flertando e produzindo várias peças em cordel (como o poema, agora épico, que escreveu sobre a Covid-19, que estará ao final desta atualização) e em Ser Tão já se evidenciava com mais força parte deste resgate, já que era paixão que trazia adormecida em seu peito desde a infância.
A revista Isto É, em um texto publicado em sua versão on-line à época do lançamento do álbum e com base em informações do jornal O Estado de São Paulo, lembrava que areaproximação de Moraes Moreira com a literatura de cordel e tudo que envolve esse universo já era notada em A Revolta dos Ritmos, remonta à infância do músico, vivida no interior na Bahia e servia de amálgama à transição que ele pretendia e já festejava, de cantor para cantador. “Vou fazer minha passagem/De cantor pra cantador/E durante essa viagem/O tempo que é passador/Vai me dar uma guarida/E muitos anos de vida/Na cantoria do amor”, são versos da faixa De Cantor Pra Cantador, na qual Moraes ora declama, ora canta, mostrando que uma habilidade não descarta a outra. “Hoje, ele é as duas coisas”, sentenciou a revista na matéria cuja integra poderá ser lida clicando aqui.
“Nesse disco, pude fazer essa ideia que tenho de juntar literatura de cordel, a influência dos cantadores, dos repentistas, essa coisa da cantoria”, disse Moraes, segundo a Isto É. “É uma cantoria, às vezes, falada, mas, na maioria das vezes, cantada, é claro”, emendou. “Essa relação já vem desde criança, e eu vivia muito isso, a coisa da sanfona, bem sertaneja mesmo, o violonista de serenata. Então, essa memória toda eu carrego.”
Ser Tãoé, portanto, completamente autoral, embora inclua uma parceria com Armandinho na faixa Nas Paradas. “”O Armandinho ficou ali meio representando os outros parceiros e eles entenderam isso, que era um momento muito meu, eu tinha que me concentrar nisso. É coisa de viola, de sanfona, quase não tem guitarra. Pedia menos guitarra e mais viola.”
Inevitavelmente, o disco acaba sendo biográfico, de uma maneira mais direta, como na já citada De Cantor Pra Cantador e em Alvorada dos Setenta, cujos versos são declamados pelo próprio músico, fechando o repertório. Ou mais indireta, quando ele se envereda por suas raízes e memórias, como em O Nordestino do Século, também declamada, e Origens, recitada e cantada. No blues I Am The Captain of My Soul, o refrão em inglês entoado na letra em português pode até causar estranheza nesse trabalho tão impregnado de Nordeste. Mas, para Moraes, o refrão fazia mais sentido assim, sem tradução. “Esse verso, ‘eu sou o capitão da minha alma’, eu li num livro. Fui pesquisar sobre isso, esse verso era de um poema, Invictus, de Ernest Henley, um inglês da época vitoriana. Um dia, me peguei cantando ‘I am the captain of my soul’. Depois, fiz a parte B da música, em português, e aí volta sempre o refrão, que tinha de ser em inglês”, disse. “São os sertões se encontrando: o sertão de lá e de cá.”
Ainda durante a conversa reproduzida por Isto É, Moraes Moreira observara que em seus tempos de Novos Baianos, nos quais o grupo criava, literalmente, a própria música, suas raízes nunca desapareceram. “Por exemplo, Preta Pretinha é uma coisa interiorana, é muito brejeira. Então, sempre teve ali um pouquinho.” O Selo Discobertas, ao lançar Ser Tão, produziu o seguinte press-release, que não apenas reforçou este perfil de Moraes Moreira, mas ampliou-o ao frisar que:
“Se a Música Popular Brasileira fosse uma cidade, Moraes Moreira seria aquele caminhante que passa por todos os bairros, cruza todas as ruas, vira em todas as esquinas… e por onde anda ele se sente em casa. Não importa se é num afoxé carnavalesco ou num arrasta-pé junino, numa batucada de samba ou numa balada urbana, sua música é como um líquido que toma a forma de todos esses vasos, sem perder o sabor. Ser Tão não chega a ser uma novidade na obra desse compositor tão litorâneo e ensolarado, tão urbano e beira-mar. aquífero acessível a quem se dispõe a ir um pouco mais fundo. Há um subterrâneo de sertão por baixo de toda a cidade-Brasil. Há uma memória de sertão juntando histórias, lendas, melodias, ritmos e personagens.
Musicalmente, Moraes sempre foi um aproximador de águas, um acolhedor de belezas. A lição tropicalista foi rapidamente assimilada por sua geração para quem o rock e o samba eram bairros vizinhos que tinham a aprender um com o outro. Canções como I am the Captain of My Soul e Nas Paradas têm um sabor geracional cuja novidade não se perdeu, cuja tinta ainda não secou. Baladas de estrada, com algo de blues e das road songs que acompanharam as histórias dos andarilhos num dos muitos sertões que o Brasil descobriu dos anos 1960 para cá .Este é Moraes Moreira, sertanejo acampado à beira-mar, capitão da própria alma, setentão sempre jovem a cruzar um sertão eterno”.
Estetoscópio de pinho
De acordo com a biografia de Antonio Carlos Moreira Pires publicada pela Enciclopédia Itaú Cultural (EIC). a carreira do compositor, cantor e violonista que adotou o nome artístico de Moraes Moreira começou quando ele ainda era adolescente, tocando sanfona de 12 baixos. Com pouco tempo de aprendizado, o piá já animava festas de São João, casamentos e batizados. Em 1963, fez o curso científico na cidade de Caculé, no interior da Bahia, onde conheceu diversos violonistas e se apaixonou pelo violão. Com 19 anos, mudou-se para Salvador com o intuito de fazer o curso de Medicina, mas optou por estudar música no Seminário de Música da Universidade Federal da Bahia. Na pensão em que morava, conheceu os futuros parceiros do grupo Novos Baianos: Paulinho Boca de Cantor e Luiz Galvão. que o apresentou ao cantor e compositor baiano Tom Zé, professor de violão no seminário e com o qual Moraes Moreira trocava informações sobre harmonia e composição.
Seus amigos de pensão começaram, então, a elaborar o espetáculo de estreia do grupo Novos Baianos,O Desembarque dos Bichos depois do Dilúvio Universal, em 1968. Contando também com a cantora Baby Consuelo (atual Baby do Brasil) e o guitarrista Pepeu Gomes na formação, o grupo deslocou-se até São Paulo para participar do 5ºFestival da Música Popular Brasileira, da TV Record (1969), defendendo a músicaDe Vera, de Moraes Moreira, com letra de Galvão. Em seguida, saiu o primeiro disco,Ferro na Boneca, antecedendo o clássico Acabou Chorare, que em 1972 venderia mais de 100 mil cópias. Ícone da discografia nacional com decisiva participação de João Gilberto, Acabou Chorare inclui no repertório, entre outras o sambaBrasil Pandeiro, de Assis Valente, além das composições próprias do grupo.
Moraes Moreira deixou os Novos Baianos e partiu para a carreira solo ainda em 1975, abraçado ao primeiro parceiro nessa caminhada, o guitarrista Armandinho. Já nesta fase, ele tocou com o trio elétrico de Dodô e Osmar (pai de Armandinho) em 1976, consagrando-se como o primeiro cantor de trio elétrico, embalando os seguidores com marchinhas comoPombo Correio, parceria dele com Dodô e Osmar. Rapidamente, Moraes Moreira ganhava fama e passava a ser apontado como um dos principais responsáveis pelo crescimento do carnaval de rua em Salvador.
Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira, outro dos seus sucessos, saiu em 1979, com canções em parceria com Pepeu Gomes, Jorge Mautner, Antonio Rizério, Abel Silva, Fausto Nilo, Armandinho e Oswaldinho do Acordeon.Santa Fé, parceria dele o poeta Fausto Nilo, é escolhida para ser o tema de abertura da novelaRoque Santeiro, de Dias Gomes, mas a trama, censurada pelo governo militar em 1975, acabaria engaveta até 1985, quando enfim foi exibida pela Rede Globo.
Um novo encontro com os Novos Baianos ocorreu em 1997, para o lançamento do disco ao vivoInfinito Circular, com canções dos discos anteriores e algumas inéditas. Dez anos mais tarde, Moraes Moreira enveredou pelo mercado editorial ao publicar oA História dos Novos Baianos e Outros Versose nesta publicação já adotou a linguagem de cordel, dando pistas da transição que viria adiante.
Análise da EIC
O diálogo entre gêneros musicais éa marca da trajetória artística de Moraes Moreira. Ao começar a carreira, seu estilo tende para o rock, mas nutre também paixão pelo samba e pelo choro, e aponta nomes como Braguinha, Lamartine Babo, Zé Kéti e Jacob do Bandolim como seus maiores inspiradores. Sua obra dialoga com as produções de Roberto Carlos, Jimi Hendrix, e com a estética do tropicalismo, proposto por Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé e outros artistas. Tais referências estão presentes emFerro na Boneca, primeiro disco do seu grupo Os Novos Baianos, que, nos anos 1960, vive numa espécie de comunidade alternativa.
A presença de João Gilberto na comunidadedosNovos Baianos contribui para acentuar o caráter musical multifacetado do grupo, fundindo sonoridades do samba, frevo e baião com o rock. Moraes Moreira aprende a maneira original de João Gilberto tocar violão e com ele se aproxima do repertório de compositores como Assis Valente. Logo cria, com Pepeu Gomes, um regional com cavaquinho e violão para o maior sucesso do autor,Brasil Pandeiro, gravado pelosNovos Baianos no álbumAcabou Chorare(1972). A canção, feita em 1940, exalta a entrada do samba no mercado musical dos Estados Unidos, alavancada principalmente por Carmen Miranda, intérprete de grande parte das músicas de Assis Valente.
As composições com Luiz Galvão vão de canções de simples harmonias, como o maior sucesso do Novos Baianos,Preta Pretinha(Acabou Chorare), de dois acordes apenas, até as de complexas estruturas, caso deOs Pingos da Chuva(Novos Baianos F.C., 1973). As influências da Bossa Nova, Jovem Guarda, tropicalismo e da música internacional resultam na sonoridade particular do grupo.
Integrando o trio elétrico de Dodôe Osmar, expande suas referências ao ser apresentado a compositores como Capiba, Nelson Ferreira, Duda, Antônio Maria (1921 – 1964) e outros nomes do frevo pernambucano.Moraes Moreira compõe a letra para uma música original de Dodô e Osmar que se torna outro grande sucesso, Pombo Correio, típica marchinha dos trios que animam o Carnaval de Salvador. Introduz a voz nos trios elétricos, que até então é só instrumental, até por uma questão técnica. Seu pioneirismo faz escola e fomenta o surgimento de uma geração de cantores de trio.
Lança seu quarto disco solo,Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira, em 1979. Além da faixa-título, que se torna hit nacional, o álbum traz canções que marcam o carnaval baiano, comoEu Sou o Carnaval,Chão da PraçaeAssim Pintou Moçambique. Esta, em parceria com Antonio Rizério, é um marco na história da música baiana, pela mistura do frevo dos trios elétricos com o batuque dos blocos afro, prenunciando as fusões que animam o Carnaval e abrindo um novo caminho na música da Bahia, que culmina na chamada geração axé music.
No CDO Brasil Tem Conserto, de 1994, em parceria com o maestro e arranjador Vitor Santos, realiza um trabalho que mescla música popular com a erudita. Nesse álbum, reforça a harmonia e a melodia, mantendo as características rítmicas de suas composições. O baião e o samba são misturados no CDBahião com H,de 2000, que aproveita na época o oportuno interesse das novas gerações pela música regional brasileira. Em 2005, o álbum De Repentefunde o hip-hop com o repente nordestino, trazendo elementos da música eletrônica e do rap, ou da “palavra falada”, como Moraes classifica.
Leia abaixo o poema em cordel deixado por Moraes Moreira sobre a Covid-19, conforme consta na página do Diário Causa Operária (DCO) sobre a morte do cantor e compositor, veículo que relatou ainda que, recentemente, Moreira e Baby Consuelo teriam protagonizado um desentendimento que demonstra a personalidade forte, a autenticidade e o respeito às próprias convicções e à história que ele tinha.
Em novembro de 2019 estreou o espetáculo Novos Baianos, no qual treze atores contavam a história da banda, com direção musical de Pedro Baby (filho de Baby Consuelo) e Davi Moraes (filho de Moraes). Esse musical, conforme o DCO, teria causado uma desavença de Moraes com Baby Consuelo, hoje em dia a evangélica Baby do Brasil. Baby queria que o espetáculo ignorasse o uso de drogas pelo grupo. Moraes afirmou que “Baby queria que o espetáculo fosse evangélico. Que não dissesse que fumou maconha, que tomou ácido, que fez tudo. Assim os Novos Baianos não seriam revolucionários. João Gilberto deve estar se revirando na sepultura. Porque o nosso grupo fumou, sim, tomou ácido, sim, fez músicas maravilhosas em estado de fumar maconha, sim. A gente fazia música inclusive pra ela. As canções dela que fizeram sucesso como A Menina Dança, Tinindo, Trincando, Os Pingos da Chuva e tantas outras, foram feitas na onda, porque naquele tempo a onda era essa”.
O DCO também observou que Moraes esteve ativo até o final da vida. No carnaval deste ano cantou no Pelourinho, mesmo já aparentando estar debilitado. Desde março ele estava recolhido à sua casa por causa do coronavírus, mas ainda compondo e escrevendo. Uma de suas últimas obras foi o cordel que fala da Covid-19, mas também lembra de Marielle Franco:
Eu temo o coronavirus E zelo por minha vida Mas tenho medo de tiros Também de bala perdida, A nossa fé é vacina O professor que me ensina Será minha própria lida
Assombra-me a pandemia
Que agora domina o mundo
Mas tenho uma garantia
Não sou nenhum vagabundo,
Porque todo cidadão
Merece mais atenção
O sentimento é profundo
Eu não queria essa praga
Que não é mais do Egito
Não quero que ela traga
O mal que sempre eu evito,
Os males não são eternos
Pois os recursos modernos
Estão aí, acredito
De quem será esse lucro
Ou mesmo a teoria?
Detesto falar de estupro
Eu gosto é de poesia,
Mas creio na consciência
E digo não a todo dia
Eu tenho medo do excesso
Que seja em qualquer sentido
Mas também do retrocesso
Que por aí escondido,
Às vezes é o que notamos
Passar o que já passamos
Jamais será esquecido
Até aceito a polícia
Mas quando muda de letra
E se transforma em milícia
Odeio essa mutreta,
Pra combater o que alarma
Só tenho mesmo uma arma
Que é a minha caneta
Com tanta coisa inda cismo….
Estão na ordem do dia
Eu digo não ao machismo
Também a misoginia,
Tem outros que eu não aceito
É o tal do preconceito
E as sombras da hipocrisia
As coisas já forem postas
Mas prevalecem os relés
Queremos sim ter respostas
Sobre as nossas Marielles,
Em meio a um mundo efêmero
Não é só questão de gênero
Nem de homens ou mulheres
O que vale é o ser humano
E sua dignidade
Vivemos num mundo insano
Queremos mais liberdade,
Pra que tudo isso mude
Certeza, ninguém se ilude
Não tem tempo, nem idade
Segunda escola de samba com mais títulos no carnaval carioca, verde-e-rosa tentará diminuir distância para a Portela — que tem dois a mais — com criação da compositora autora do tema vencedor dos desfiles em 2019 que virou hino nacional contando a história não-oficial do Brasil
O texto que abaixo desta introdução vocês lerão está publicado, originalmente, na versão eletrônica da Revista Fórum, amigo e seguidor.
Com a devida autorização, vamos compartilho-la aqui no Barulho d’água Música apenas com o título modificado (o original é “Em busca do bi, Mangueira define samba para 2020 com recado para Bolsonaro”), mas o restante preservado, na íntegra, portanto.
A intenção não apenas é divulgar o que a campeoníssima e popular escola carioca levará à passarela da Marques de Sapucaí, na cidade do Rio de Janeiro, em 2020, mas, por oportuno que é para nossas reflexões, no momento em que celebramos o nascimento do Cristo exaltado na letra do samba-enredo, esperançosos de que com Ele venham para 2020 tempos mais equilibrados nos terrenos socioeconômico, da cultura, da política, das relações humanas em geral — em que pesem as mazelas que o clã e apoiadores do “messias” que se encontra no comando da nação arquitetam e já praticam, por meio de atitudes e palavras que desestabilizam qualquer possibilidade de futuro fraterno aqui em Pindorama!
Então, peguem a visão: que sem soltar a mão de ninguém, pois não é hora de se alienar, unamos-nos em torno deste Cristo e Nele encontremos a força e a coragem para seguirmos adiante, empreendendo as lutas que nos cabem e das quais não podemos, jamais, fugir!
Este texto também é o primeiro de outros da Revista Fórum que trazem ou trarão conteúdos relativos à música que, doravante, pretendemos compartilhar!
Boa leitura a todos!
Obrigado Julinho Bittencourt.
Luz e paz, Feliz Natal e boas lutas em 2020!
Por Lucas Rocha
Campeã do carnaval da cidade do Rio de Janeiro de 2019 contando a história não oficial do Brasil, a Estação Primeira de Mangueira apresentará em 2020 novo samba enredo crítico que exalta a figura solidária de Jesus Cristo e prega o olhar para os oprimidos. A canção que embalará o desfile assinado pelo carnavalesco Leandro Vieira é composta pela mesma autora do samba que virou hino em 2019, Manuela Oiticica, a Manu da Cuíca.
“Nós somos bicampeões e eu queria ressaltar o caráter democrático e revolucionário da disputa de samba, que colocou os compositores e compositoras em destaque. O grande homenageado da Mangueira é Jesus Cristo, que luta pela partilha e pela fraternidade. Com certeza, ele aprovaria uma disputa como essa, aprovaria uma escola espetacular que trate a favela como um ato de sobrevivência, especialmente com esse governo que mais mata favelados e o samba mostra que estamos vivos”, declarou Manu da Cuíca ao carnavalesco após a vitória. Ela assinou a composição em parceria com Luiz Carlos Máximo.
A composição destaca a força do samba, exalta a esperança contra a intolerância e relembra a origem pobre de Jesus de Nazaré. “Nasci de peito aberto, de punho cerrado/ Meu pai carpinteiro desempregado/ Minha mãe é Maria das Dores Brasil/ Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira/ Me encontro no amor que não encontra fronteira/ Procura por mim nas fileiras contra a opressão/E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão”, diz uma das estrofes.
O samba-enredo de Manu da Cuíca que rendeu o título de 2019 à Mangueira levou à avenida o Brasil que está fora dos livros e entre outros heróis anônimos exaltou a ex-vereadora Marielle Franco, assassinada ao lado do ex-motorista, Anderson Gomes, em março de 2018, por forças milicianas (Fotos: Tomaz Silva/Agência Brasil Rio de Janeiro-RJ)
Em um dos trechos do samba há um menção indireta ao presidente Jair Bolsonaro, que tem Messias como sobrenome: “Favela, pega a visão/ Não tem futuro sem partilha/ Nem Messias de arma na mão”.
Para João Paulo Farelli, torcedor da Mangueira e publicitário, a canção resgata a voz da resistência por meio da figura social e política de Jesus e contrapõe o conservadorismo e o fundamentalismo religioso. “Certamente, hoje, por compaixão, Jesus renasceria ao lado daqueles que carregam diariamente a cruz do preconceito, da intolerância e injustiça social. Afinal, ele é Jesus da gente”, disse.
“Talvez a escuridão que estamos atravessando dure mais do que pensamos, mas a esperança que reside no lado esquerdo do peito nos faz acreditar num futuro melhor. Um futuro com partilha e sem Messias de arma na mão”, declarou Farelli à Revista Fórum. “Espero um desfile marcante, no qual a verdade prevaleça, essa verdade que nos fará livre”, completou.
A verde-e-rosa possui 20 títulos do carnaval carioca e fica atrás apenas da Portela, que levantou o troféu 22 vezes.
A Mangueira desfilará na Marques de Sapucaí a partir das 23h30 do domingo de 23 de fevereiro.
Confira a letra completa do samba enredo da Mangueirae clique na palavra em destaque para ouvi-lo:
Senhor, tenha piedade!/Olhai para a Terra:/Veja quanta maldade! (2x)
Alô Mangueira/agora é a nossa vez:/ vem, vem comigo!
Mangueira/Samba que o samba é uma reza/Se alguém por acaso despreza/Teme a força que ele tem
Mangueira/Vão te inventar mil pecados/Mas eu estou do seu lado/E do lado do samba também
Eu sou da Estação Primeira de Nazaré/Rosto negro, sangue índio, corpo de mulher/Moleque pelintra do Buraco Quente/Meu nome é Jesus da Gente
Nasci de peito aberto, de punho cerrado/Meu pai carpinteiro desempregado/Minha mãe é Maria das Dores Brasil/Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira/Me encontro no amor que não encontra fronteira/Procura por mim nas fileiras contra a opressão/E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão
Eu tô que tô dependurado/Em cordéis e corcovados/Mas será que todo povo entendeu o meu recado?Porque de novo cravejaram o meu corpo/Os profetas da intolerância/Sem saber que a esperança/Brilha mais que a escuridão
Favela, pega a visão/Não tem futuro sem partilha/Nem Messias de arma na mão
Favela, pega a visão/Eu faço fé na minha gente/Que é semente do seu chão
Do céu deu pra ouvir/O desabafo sincopado da cidade/Quarei tambor, da cruz fiz esplendor/E num domingo verde-e-rosa/Ressurgi pro cordão da liberdade
Data tem duas fontes que se referem a documento redigido na Guanabara, na década dos anos 1960, instituindo o Dia Nacional do ritmo que antes de se tornar popular era motivo de perseguições e de forte repressão
Vários eventos em todo o país estão programadas para comemorar neste domingo, 2 de dezembro, o Dia Nacional do Samba, ao qual são atribuídas pelo menos duas origens, próximas, na década dos anos 1960, no antigo estado da Guanabara e em Salvador (BA). A data apareceu mencionada pela primeira vez em documento conhecido como Carta do Samba, redigido ao término do Primeiro Congresso Nacional do Samba, entre 28 de novembro e 2 de dezembro de 1962, no Palácio Pedro Ernesto, no Rio de Janeiro, e, mais tarde, ressurgiu por iniciativa de Luiz Monteiro da Costa, vereador soteropolitano. Costa conhecia a Carta do Samba e apresentou à Câmara Municipal de Salvador, em 3 de outubro de 1963, o Projeto de Lei n° 164/63, cuja redação “institui o Dia do Samba, manda preservar as características da música popular e dá outras providências”.
Ativista corajosa e defensora de pobres e de negros, executada no auge da vida , ela é uma das personalidades citadas na composição que tira a poeira dos porões e revela o Brasil que não está mencionado nos livros de história*
A Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira cantará na Marques de Sapucaí durante o desfile do Carnaval 2019 da cidade do Rio de Janeiro (RJ) o samba-enredo História para ninar gente grande, que entre outras personagens homenageará a ex-vereadora do PSOLMarielle Franco. A “Verde-e-Rosa” iniciará sua passagem na passarela por volta das 2h40 da segunda-feira, 4 de março, e terá até 3h15 para apresentar o enredo que deverá levantar as arquibancadas e ainda cita os cantores Leci Brandão e Jamelão. A composição de Deivid Domênico, em parceria com Tomaz Miranda, Mama, Márcio Bola, Ronie Oliveira e Danilo Firmino, foi escrita para tirar as poeiras dos porões, reverenciar quem foi de aço nos anos de chumbo, resgatar a história que a história não conta de mulheres, tamoios e mulatos e de um país que não está no retrato. Ou seja: a ideia é revelar o ‘lado B’ de Pindorama desde 1.500, com versões mais críticas a feitos atribuídos a Pedro Álvares Cabral, Princesa Isabel, Dom Pedro I e Marechal Deodoro, entre outros “heróis” do almanaque tupiniquim.
A cantora e compositora paulistana Katya Teixeira está com single novo já disponibilizado pela Tratore Digital para audição. Violetas e Margaridas retrata a mulher dentro do contexto social e histórico, do campo às grandes metrópoles, e apresenta duas versões da mesma canção, em português e espanhol. A música integra a coletânea Herencia Rebelde – Trovadoras Sin Fronteras en la Ruta de Violeta, lançado no Chile por Cecília Concha Laborde em homenagem ao centenário de nascimento de Violeta Parra, em 2017, com 51 cantautoras latino-americanas.
O centenário de nascimento de Violeta Parra foi comemorado em 2107 no Chile e em vários lugares do mundo que admiram músicas como Volver a los 17 e Gracias a La Vida, que ela compôs
A exemplo de Violeta Parra, que foi uma mulher a frente de seu tempo e deu voz a seu povo por intermédio de sua arte, dentre tantas temos Margarida Maria Alves, no Brasil, a primeira mulher a lutar pelos direitos trabalhistas no estado da Paraíba durante a ditadura militar e que acabou pagando com a vida por suas posturas e convicções, abatida na cidade onde nascera (Alagoa Grande), em 12 de agosto de 1983, uma semana depois de ter completado 50 anos, na presença do marido e do filho.