1625- Mário Sève & grupo lançam Ouvindo Paulinho da Viola, no Sesc 24 de Maio*

#MPB #Choro #MusicaInstrumental #MusicaLatinoAmericana #CulturaPopular

*Do texto original divulgado pela Kuarup

Disco da Kuarup em homenagem ao consagrado sambista e também herdeiro dos mestres do choro passeia por releituras instrumentais da obra do carioca e tem capa de Elifas Andreato

Em 2022 Paulinho da Viola, um dos mais queridos e aclamados personagem de nossa história musical, completou 80 anos de vida. Famoso pela sua trajetória como sambista, o que muitos de nós pouco sabemos é que ele também é legítimo herdeiro de mestres chorões da importância de Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Canhoto da Paraíba e Radamés Gnattali. Por sua atuação diante dos clubes de choro pelo Brasil, pela montagem do antológico espetáculo carioca Sarau que marcou o ressurgimento do Conjunto Época de Ouro, criado por Jacob e gravação do álbum em vinil Memórias Chorando, Paulinho da Viola se destacou no final do século XX como símbolo da renovação do choro, gênero musical de mais me comove”, costuma afirmar o autor de geniais choros e belíssimas valsas que dão sentido à afirmação.

Paulinho da Viola é hoje aclamado como um dos principais compositores e intérpretes contemporâneos dos dois gêneros musicais brasileiros. Mais do que fãs e admiradores, criou uma escola que tem entre seus luminares devotos Mário Sève, autor do disco do selo da produtora e gravadora Kuarup Ouvindo Paulinho da Viola, com noite de lançamento nesta quinta-feira, 27 de abril, a partir das 20 horas, no palco da unidade 24 de Maio do Sesc paulistano. O espetáculo inclui temas instrumentais consagrados de Paulinho da Viola, como Choro negro e Sarau para Radamés, apresenta obras com parceiros e inéditas entre elas o choro Chuva Grossa também molha e a valsa Carinhosa, com o diretor musical e arranjador do concerto, Mário Sève , além de músicas de Pixinguinha, sua grande referência. Este requintado repertório articula os sentidos da tradição e da modernidade, dicotomia que atravessa toda a obra Paulinho da Viola.

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1613 – Louça Fina, um dos discos da consagrada Sueli Costa, embala homenagem no Solar do Barulho

#MPB #CulturaPopular #JuizdeFora #MinasGerais #RioDeJaneiro #CidadeMaravilhosa #EstânciaTurísticadeSãoRoque

Morte de cantora e compositora carioca deixa saudades e colegas do meio musical, ao expressarem pesar, reafirmam sua admiração ao destacarem a importância para o país da obra da autora de sucessos como Jura Secreta, Canção Brasileira e Primeiro Jornal

As tradicionais audições matinais aos sábados no Solar do Barulho, redação do Barulho d’água Música, na Estância Turística de São Roque, no Interior paulista, começaram no dia 11 com Louça Fina, álbum gravado em 1979 por Sueli Costa. Carioca nascida Sueli Correa Costa, em 1943, a autora partiu de causas não reveladas há uma semana, no dia 4 de março, também na cidade do Rio de Janeiro, prestes a completar 80 anos. Sua morte ao ser repercutida em vários meios de comunicação voltou a causar comoção entre amigos, fãs e no meio artístico devido à popularidade que ela alcançou ao vivenciar momentos de estrela de sensível inspiração melódica no cenário musical brasileiro que marcaram a composição e a interpretação de sucessos que incluem Primeiro Jornal, gravada por Elis Regina e Jura Secreta, que Fagner e Simone interpretaram, por exemplo. O cantor cearense também popularizou Canção Brasileira e a baiana Cordilheiras.

A mãe de Sueli Costa tocava piano e ministrava aulas de canto coral e a jovem, estimulada por este ambiente, ainda na adolescência tornou-se autodidata e aprendeu a tocar violão ao lado dos irmãos (Élcio, Lisieux, Telma e Afrânio), que também seguiam os passos da matriarca. Aos 18 anos, Sueli debutou ao compor a bossa nova Balãozinho. Por esta época, conciliava a incipiente carreira musical com a faculdade de Direito, que cursava em Juiz de Fora, localizada na Zona da Mata mineira e próxima à Cidade Maravilhosa. Na terra natal do violeiro Tavinho Moura, dos poetas Murilo Mendes e Pedro Nava, e do jornalista e escritor Fernando Gabeira Sueli Costa compôs e cantou todas as canções da montagem teatral Cancioneiro de Lampião, encenada pelo Grupo Divulgação em 1967. Ela também contribuiu para a trilha da peça Bodas de Sangue, no mesmo ano. Sua produção como compositora atraiu a admiração de intérpretes como a capixaba de Vitória Nara Leão e a levou a participar de variados em festivais, além de lecionar música em colégios cariocas.

Arte da capa de Louça Fina, que em detalhe revela uma lágrima derramada por Sueli Costa na hora da produção da foto de autoria, infelizmente, não descoberta

Seu período de maior projeção ocorreu na década dos anos de 1970. Nesta década a lista de admiradores que despertaram para o talento da compositora aumentou e passou a incluir Ney Matogrosso, Simone, Cauby Peixoto, Pedro Mariano, Joanna, Fagner, Fafá de Belém, Alaíde Costa, Ângela Rô Rô, Elis Regina, Ivan Lins, Zélia Duncan, Zizi Possi, Agnaldo Rayol, Gal Costa e Wanderléa, Ithamara Koorax, entre outros, consagrando-a como nome de elite da MPB. Não demorou muito, a EMI a contratou e, em 1975, Sueli Costa gravou o primeiro bolachão, com produção de Gonzaguinha e arranjos de Paulo Moura e Wagner Tiso. Dois anos depois, o segundo disco, batizado Sueli Costa como o anterior, foi produzido por João Bosco e Aldir Blanc. O time de parceiros de estrada não é menos brilhante e vão de Cacaso a Tite de Lemos a Aldir Blanc, Ana Terra, Paulo César Pinheiro e Abel Silva, com quem formou uma dupla de sucesso e é coautor de Jura Secreta.

A discografia de Sueli Costa ainda inclui Vida Louça fina; Íntimo (1984); Vida de Artista (1994); e Minha arte (2000), além de Sueli Costa -Série Dois em Um, relançamento em formato laser dos vinis Sueli Costa e Vida de artista. Entre os projetos que participou e a lev aos palcos estão em seu currículo Projeto Pixinguinha, Com Paulinho da Viola, Moraes Moreira, Fagner e Terezinha de Jesus (1975); Projeto Pixinguinha, com Simone (1978); Canção Brasileira, com Abel Silva, no Teatro Estação Beira-Mar/ RJ (1997); Sueli Costa no Bar do Tom/RJ (1999) e Minha Arte, Mistura Fina/RJ (2000).

Sueli, Sueli Costa, quantas sublimes melodias você criou e deixou nesse mundo que será sempre mais bonito cada vez que uma canção sua soar nos ares do país e do universo. Talvez entre as melodias mais bonitas do Brasil, as suas sejam as mais ricas e divinas. Quem compôs belezas assim só pode estar num lugar maravilhoso agora, inundado de arte e plenitude. Obrigada.

Consuelo de Paula

Quando tenho arrepios de alma por conta de emocionantes letras ou melodias, agradeço a Deus, à vida, à musa música por me permitir tais presentes nesta passagem chamada vida. E como isso me é comum na ‘Canção Brasileira’ em geral.

Sueli Costa, nos presenteou, em parceria com Abel Silva, com uma dessas maravilhas de arrepios em lindeza: Canção Brasileira! Agora, ela se torna uma estrela no céu, a brilhar com os anjos. Muito obrigado, Sueli Costa por teres iluminado nossas vidas, nossos ouvidos, nossas almas.

Tavinho Limma, que gravou Canção Brasileira ao lado de Paulinho Pedra Azul, com arranjos e piano de Salomão Soar em O Mundo de Raimundo, da Kuarup;

“O meu coração ateu quase acreditou

Na sua mão que não passou de um leve adeus

Breve pássaro pousado em minha mão

Bateu asas e voou … “

Ah, Sueli Costa. Sem dúvida uma das maiores! Compositora gigante! Referência total!

Lembro-me de quando gravei meu primeiro CD: tal como uma contracapa de livro, foi ela a assinar o encarte do meu disco. Palavras para lá de carinhosas, que foram de grande importância pra mim.

Obrigada, Sueli, vai em paz

Cristina Saraiva

Sueli Costa: uma das maiores compositoras da música brasileira. Muitas canções em tantas diversas interpretações. Essa nossa gente precisa conhecer mais e entender de Brasil, de sua arte, cultura e poesia.

A bênção @suelicosta1213!

Aplausos em pé para sua eternidade e tudo que nos deu em vida.

Lenir Boldrin

Minha querida Sueli Costa, me perdoe por não poder estar com você nos últimos anos. Um pouco antes da pandemia marcamos um encontro, que infelizmente não aconteceu. Trocamos algumas palavras por mensagem sempre na esperança de nos encontrar. Agora, essa triste notícia.

Durante muitos anos Sueli acalentava um sonho, gravar as composições feitas dos poemas de o Romanceiro da Inconfidência de Cecília Meireles, sonho que infelizmente não se concretizou devido às questões entre os herdeiros da poeta.

Gravei os demos no meu estúdio com ela cantando ao piano, um registro emocionado e inesquecível. Tive a sorte e o privilégio de produzir o CD Sueli Costa – Minha Arte, de 1999, com o apoio do querido Mario Rosito. Fomos parceiros de noitadas em torno de uma mesa, regadas a música e poesia, seguimos afastados por um tempo, porém nunca esquecemos um do outro. Não vou dizer que Sueli Costa estará cantando lá no céu porque o lugar dela é aqui. Como grande criadora da música popular brasileira jamais será esquecida.

Suelen, era assim que eu e [Maria] Bethânia a tratávamos, fica a saudade eterna, amada amiga.

Jaime Além

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1592 – Moisés Navarro (MG) grava músicas pouco conhecidas de Gilberto Gil em álbum com direção de Jaime Alem*

#MPB #Samba #Cinema #CulturaPopular

Parte das mais luminosas estrelas da constelação Maior da Música Popular Brasileira já adentrou a casa dos 80 anos de idade (ou está bem perto dela), como os baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso, o carioca Paulinho da Viola, além do mais mineiro dos cariocas, Milton Nascimento, que, há poucos dias, despediu-se do cenário musical com uma memorável apresentação no estádio do Mineirão, em Belo Horizonte (MG), sobre a qual, em breve, publicaremos aqui neste Barulho d’água Música texto escrito pelo poeta, cantor, violonista, violeiro, produtor cultural e compositor Makely Ka, um dos milhares de fãs que prestigiaram o emocionado adeus de Bituca aos palcos. No caso de Gil, a extensa e memorável contribuição às causas culturais do Imortal ora reconhecida pela Academia Brasileira de Letras (ABL) e com passagem pelo Ministério da Cultura (quando a pasta não servia como abrigo de gente com capacidade sofrível e desprovida de moral encarregada de desmontar nossas tradições) acaba de ganhar uma nova e imperdível releitura, disponível nas plataformas digitais, desde 17 de novembro. Aquele Abraço, Gilberto Gil, álbum do mineiro Moisés Navarro, funde o repertório de três epês que o autor lançara ano passado em tributo à obra de um dos nossos mais encantadores sábio e ocupante da cadeira 20 da ABL, mais duas gravações inéditas: Logos versus logo, em dueto de Navarro com o rapper Renegado, e Serafim, faixas de abertura e de fechamento, respectivamente

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1585- Mário Sève lança Ouvindo Paulinho da Viola, dedicado aos 80 anos do sambista

#MPB #Samba #Choro #MúsicaInstrumental #CulturaPopular #RiodeJaneiro

Disco com capa de Elifas Andreato traz entre as faixas duas composições inéditas mescladas a composições consagradas do homenageado. E terá concerto para lançamento no Theatro Municipal do Rio de Janeiro

Em 12 de novembro Paulinho da Viola, consagrado personagem de nossa história musical, completará 80 anos de idade e para marcar a data a produtora e gravadora Kuarup já disponibilizou (exclusivamente nas plataformas digitais) Ouvindo Paulinho da Viola, disco com 12 choros que traz temas consagrados como Choro Negro e Sarau Para Radamés, apresenta obras com parceiros e duas inéditas, o choro Chuva Grossa Molha Mesmo e a valsa Carinhosa, compostas com Mário Sève, autor do álbum. Flautista, saxofonista e integrante do seleto grupo de Paulinho da Viola, Sève é também coautor do choro Vou-me Embora Pra Roça, lançado no álbum Sempre se Pode Sonhar, do compositor e sambista. O lançamento do álbum Ouvindo Paulinho da Viola terá direito a um concerto de Sève, programado para duas rodadas no Theatro Municipal do Rio de Janeiro (sala Mário Tavares) em 16 de novembro, às 17 e às 19 horas.

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1522 – Atribuição de sucessos de Ruy Maurity aos seus intérpretes contribui para por no esquecimento obra das mais genuinamente brasileiras

#MPB #Samba #RockRural #MúsicaRegional #Umbanda #Candomblé #Telenovelas #CulturaPopular #ParaíbadoSul

É costume recorrente entre alguns apresentadores de programas musicais populares de rádio e também de provedores de conteúdos na internet atribuir a autoria de composições que estão sendo tocadas ou divulgadas, em determinados momentos, a quem as interpreta, quando não deixam de mencionar o compositor. Estes erros podem ser apenas pura e simples ignorância ou desatenção, mas são equívocos que podem contribuir de maneira impactante na desvalorização da carreira dos criadores, dos mais tarimbados aos menos criativos, ajudando, inclusive, a mantê-los no ostracismo ou longe da fama que mereceriam, permitindo a outros fazerem fortuna com o chapéu alheio. Sem contar que podem ser entendidos como violação, ainda que involuntária, da propriedade intelectual e imaterial de um trabalho artístico que levou tempo e exigiu algum grau de elaboração para tirar o branco do papel.

Quem viveu a adolescência e a juventude na virada dos anos 1970 para os 1980, como eu, ouviu bastante e cantou em rodinhas, animadas por um violão, Serafim e Seus Filhos e Marcas do Que se Foi, por exemplo. A primeira varou o tempo e chegou bastante conhecida ainda nos dias atuais; a segunda, mais propriamente um jingle, embalou as chamadas de final de ano da Rede Globo, em 1976: em uma de suas versões, levava o telespectador a passear por bucólicas paisagens rurais; eu, com 12 para 13, “viajava” nas imagens que me colocavam a bordo da velha “jaú”¹ azul marinho do motorista Zé Portes subindo e descendo a empoeirada estrada de ligação entre Juiz de Fora e Chácara, cidades da Zona das Mata mineira, onde mor(ava)m tios e avôs paternos. Serafim e Seus Filhos, arrisco defender, tem uma das letras mais interessantes e poéticas de nosso cancioneiro (leia matéria a respeito, de José Mário Espínola, médico e escritor, clicando aqui), foi bastante difundida quando “estourou” e, justamente por virar um sucesso atemporal, muita gente gosta de regravá-la – na maioria das versões que conheço, felizmente e ao menos, preservando o seu arranjo original, com poucas alterações.

Marcas do Que Se Foi chegou a ser sulcada em um bolachão (Estrelas, de 1977), com sua autoria atribuída aos The Fevers, enquanto a mística Serafim e Seus Filhos aparece citada por ai ora como composição de Zezé Di Camargo & Luciano, ora, ainda, de Sergio Reis, por exemplo. Consuma-se, assim, um dos erros citados acima, posto que entre os autores de ambas um deles é Ruy Maurity, fluminense que partiu para o Plano Maior há alguns dias – embora, justiça seja feita: há pouco tempo envolvido no centro de uma infeliz polêmica política, o cantor sertanejo/caipira, em um dos shows do seu projeto Sergio Reis e Filhos que promoveu há anos, disse em bom e alto tom quando começava a executá-la em um concerto da turnê que Maurity é o autor, em parceria como José Jorge, da épica saga que se passa em noite alta de lua mansa. A dupla Maurity/Jorge, arco e flecha na biografia de ambos, também é devidamente mencionada nos créditos do álbum que as apresentações ao vivo do projeto SR renderam – disco por sinal belíssimo, lançado pela Atração Fonográfica, em 2003 e daqueles que valem a pena ter e ouvir, sempre… mesmo se você tenha “cancelado” o Sergião no ano passado, talquêi?!. Marcas Do Que se Foi também é de Maurity e de Jorge, com Paulo Sérgio Valle, Tavito (1946 – 2019), Ribeiro e Márcio Moura, embora de autoria oficialmente creditada à produtora de jingles Zurana.

Antonio Adolfo (de óculos), abraçado por Ruy Maurity, escreveu: “Uma notícia muito triste: meu querido irmão e grande compositor, Ruy Maurity, foi embora para sempre essa noite. Ficará sua obra lindíssima e as lembranças da maravilhosa pessoa que sempre foi. Fique em Paz. Você sempre mereceu o nosso amor! Viva Ruy Maurity!” Já Carol Saboya comentou: “Nessa madrugada, meu tio Ruy Maurity nos deixou. Uma pessoa muito amorosa, um compositor incrível! Vai fazer muita falta!” (Foto: Acervo da família)

Ruy Maurity de Paula Afonso nasceu em Paraíba do Sul (RJ) e saiu de cena em 1º de abril, aos 72 anos, após dias em coma provocada por duas paradas cardíacas, decorrentes de um exame de endoscopia. Era filho da primeira violinista a integrar a Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal da cidade do Rio de Janeiro, Iolanda. Seu irmão é o pianista e compositor Antonio Adolfo, pai da bela cantora Carol Saboya. Contudo, a obra de Maurity na cena musical nacional não alcança o mesmo reconhecimento da de Adolfo — que segue ativo, reside nos Estados Unidos da América e desenvolveu sólida carreira no Exterior gravando, por exemplo, ótimos tributos a Milton Nascimento e Tom Jobim, entre trabalhos autorais de fôlego. Esta obliteração do irmão pela mídia, somada aos equívocos das autorias creditadas a seus interpretes, configura outro pecadilho contra o legado de Maurity – algo muito semelhante ao que até hoje sofre Sidney Miller, embora a genialidade de ambos os deixe nos mesmos patamares, por exemplo, de Belchior e de Chico Buarque, embora estes tenham estilos mais bem definidos ou pouco menos ecléticos dentro do guarda-chuva da MPB.

Muito mais do que Serafim e Seus Filhos e Marcas Do Que Se Foi, Maurity emplacou várias de suas composições em novelas da Vênus Platinada como A Escalada, Fogo Sobre Terra e Dona Xepa (na trama de 1977, a original, da Globo³, é dele o tema de abertura), em época na qual a vendagem de discos de vinil com as respectivas trilhas dos folhetins globais era turbinadora das receitas e carro-chefe da gravadora Som Livre. A ele é dado o status de um dos percursores do Rock Rural – gênero pelo qual também transitou concomitantemente e talvez com maior identificação Sá, Zé Rodrix, Guarabyra, Tavito e, no qual, até hoje, Zé Geraldo põe bolas no ninho da coruja – e às do segmento contido na ampla etiqueta #MúsicaRegional. Maurity, contudo, talvez seja, mesmo, com maior e indiscutível mérito, um dos baluartes mais iluminados entre compositores e intérpretes (como Geraldo Filme, Luiz Américo, Clara Nunes, Clementina de Jesus e Martinho da Vila) de um terreno no qual hoje se destacam Mateus Aleluia, Mariene de Castro e o violeiro mineiro Paulo Mourão, só para começar a riscar a pemba: o do samba que dialoga com elementos da religiosidade de matriz africana, trajado quase que essencialmente de branco, com os dois pés bem fincadinhos nos sagrados terreiros da Umbanda e do Candomblé!

Religiões que têm milhares de adeptos espalhados pelo país, embora ainda sejam alvos de intolerância e preconceitos injustificáveis, a Umbanda e o Candomblé, referências claras aos seus rituais e costumes de ambas aparecem no repertório de Maurity, de forma bem demarcada como uma batida de atabaque em Barravento. Revelam-se em letras e arranjos apoiados em instrumentos típicos como a da clássica Nem Ouro Nem Prata, faixa-título do, talvez, melhor entre tantos ótimos álbuns de Ruy Maurity, este lançado em 1976, que sobrevive na memória popular embalada pelos versos de um ponto cantado largamente em giras Brasil adentro: Samborê, pemba, é folha de jurema; Oxóssi reina de Norte a Sul… Esta veia também pulsa em Quizumba de Rei; e Xangô, o Vencedor (do mesmo álbum de 1976); aparecera antes em Cajeré (Safra/74, 1974); retornou em Festa Crioula, Sete Cavaleiros, Ganga Brasil e Pai João (Ganga Brasil, 1977) e repetiu-se, por exemplo, em Ponto Final (Bananeira Mangara, 1978) e Casamento de São Jorge e Réquiem De Uma Princesa Nagô (Natureza, 1980),

O talento de Ruy Maurity e sua ampla identificação com as tradições e costumes da brasilidade, portanto, constituem uma obra copiosa e entranhada na cultura popular. Mas, ainda assim (ou talvez por isso?) tão logo o moço recebeu de Oxóssi permissão para andar livremente pelas matas, para ver o mundo do alto das montanhas de Xangô ou fluir como espírito livre feito as águas abençoadas por Mãe Oxum, não mereceu nem na mídia especializada pouco mais do que notas curtas ou textos burocráticos em obituários. Mas como provavelmente ainda no ventre de Dona Iolanda o menino escutou a gargalhada do Tranca Ruas. ao abrir a porteira para vir ao mundo já baixou com moral junto a baianos, boiadeiros, marinheiros, pretos velhos e logo aprendeu a tocar violão, sozinho. Como muita gente boa, deu os primeiros passos na carreira em festivais a partir do efervescente 1968, ano de chumbo em que sua Arruaça (composta com José Jorge) foi defendida no I Festival Universitário de Música Brasileira pela cantora Sônia Lemos, conforme lembrou em seu blogue Pop & Arte o jornalista Mauro Ferreira, do portal G1. Maurity teve outras duas parcerias com José Jorge gravadas por Maysa, em 1969, Estranho Mundo Feliz e Quebranto, antes de faturar o III Festival Universitário de Música Brasileira, em 1970, com a música Dia cinco, mais uma das muitas parcerias com José Jorge, ainda conforme Ferreira.

Brasil ame-o ou deixe-o, tricampeão de futebol no México. Naquele mesmo ano saiu o primeiro elepê – Este é Rui Maurity, que faz uma alusão à Alegria, Alegria, de Caetano Veloso, e ara o roçado para Serafim e Seus Filhos, apresentada, pela primeira vez, em 1971, entre as faixas de Em busca do ouro². Três anos depois, Ruy Maurity assinou Safra/74, que teve canções incluídas nas trilhas sonoras de Escalada e Fogo Sobre Terra. Em 1976 e 1977, brindou-nos com Nem Ouro Nem Prata e Ganga Brasil, que inclui a global Dona Xepa. Bananeira Mangará, no ano seguinte, renovou a discografia, mais uma vez com bônus de louvor dados pela crítica a começar pela música de abertura, Pelo Sinal; depois, na década dos anos 1980, voltou aos estúdios para gravar Natureza (da capa em que ele está pescando uma bota em um riacho) e A Viola no Peito. Em 1998, com arranjos de temática caipira, produziu De Coração, no qual reinterpretou, por exemplo, Serafim e Seus Filhos e Menina do Mato, reavivando diversas parcerias com José Jorge.

Nem Ouro Nem Prata foi regravada por Teresa Cristina, em 2007, quando a filha de Paulinho da Viola lançou o álbum Delicada. Dos sete álbuns do período durante o qual Maurity esteve em alta na década dos anos 1970, Este é Ruy Maurity é o único que não tem o selo da Som Livre, marca distintiva dos demais que são: Em busca do ouro (1972), Safra/74 (1974), Nem Ouro Nem Prata (1976), Ganga Brasil (1977), Bananeira Mangará (1978) e Natureza (1980); Safra/74 teve produção de Eustáquio Sena e arranjos de Antonio Adolfo, e dele Ferreira destacou “músicas inspiradas” como Parábola do Pássaro Perdido e Com Licença, Moço, ambas compostas por Maurity e José Jorge. De Bananeira Mangará Mauro Ferreira pinçou a parceria então inédita de Maria Bethânia com a violonista e compositora Rosinha de Valença em Cana caiana (1978), “música afinada com o Brasil rural cantado com inspiração por Ruy Maurity.”

Os discos, ainda observou o blogueiro do G1, apresentam títulos que já evocam a brasilidade entranhada na obra do artista. “Após esse período áureo, Maurity gravou poucos discos a partir dos anos 1980. Mas os álbuns que deixou ainda guardam pérolas que merecem ser pescadas no baú”, emendou Ferreira. Citando versos da canção atribuída ao The Fevers, Mauro Ferreira terminou sua matéria com a frase “os passos de Ruy Maurity pelo chão do Brasil vão ficar”. Laroyê!


¹ Jaú é como meu pai, Geraldo Caetano de Lima, chamava uma “jardineira”, antigo modelo de ônibus como era o de Zé Portes. O trajeto entre Juiz de Fora e Chácara é de 28 quilômetros, hoje, asfaltados.

² A música Serafim e Seus Filhos teve uma segunda versão, a continuidade da saga, gravada como As Artimanhas de Lourenço, Filho de Serafim, como faixa 11, em Natureza.

³ A novela Dona Xepa primeiro foi exibida pela TV Globo, entre 24 de maio a 24 de outubro de 1977, em 132 capítulos, no horário das 18 horas. Era baseada na peça teatral homônima, escrita em 1952, por Pedro Bloch, adaptada por Gilberto Braga, com direção de Herval Rossano. O elenco reuniu Yara Cortes, Reinaldo Gonzaga, Nívea Maria, Edwin Luisi, Rubens de Falco, Cláudio Cavalcanti e Ana Lúcia Torre nos papéis principais. Em 2013, a Record pôs uma segunda versão no ar, em 91 capítulos, sempre às 221h15 de 21 de maio e 24 de setembro de 2013.

4 A “paternidade” de Marcas do Que se Foi, na internet, também aparece para Zezé Di Camargo & Luciano, Roupa Nova e Padre Marcelo Rossi, entre outros equívocos. 

Marcelino Lima é jornalista formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1991, atuou como repórter, editor e revisor dos mais importantes jornais de Osasco e região,  em diversas coberturas da área esportiva, cultural, política e sindical, em assessoria de imprensa para várias entidades e prefeituras, além de campanhas eleitorais. Também é fotógrafo e há oito anos coordena as publicações do Barulho d’água Música. Para contribuir com o blogue, deposite qualquer quantia no PIX 04992937896 ou 992590769.



      

1517 – Morte de Elifas Andreato tira da luta contra o desmonte cultural e os ataques à democracia um dos nossos mais respeitados combatentes

# MPB #ArtesPlásticas #DesignGráfico #HistóriadoBrasil #CulturaPopular

Entrei nesses movimentos todos, nessas publicações, porque passei a fazer parte de um seleto time que tinha coragem para realizar aquilo. Muita gente hoje lê a história, mas não imagina o que era de fato (…) Nós éramos todos guerrilheiros, militantes, e toda vez que me chamaram para desenhar alguma coisa com a qual eu concordava, sempre fiz.”

Elifas Andreato, em entrevista para a revista Comunicação e Educação (2006)

O desenho maior,  ao centro da imagem acima entre algumas das capas de disco que Elifas Andreato criou, é do ilustrador, compositor e violeiro paulistano Yuri Garfunkel, feito a pedido do Barulho d’água Música seguindo os traços do artista plástico paranaense. Obrigado, Yuri, sucesso sempre para você!

 

 

O Brasil amargou no dia 29 de março a perda em suas fileiras de resistência político-cultural do artista plástico, jornalista, escultor e militante de esquerda Elifas Andreato. Aos 76 anos, o mais consagrado ilustrador dos recentes tempos, incluindo os bicudos anos de chumbo, morreu na cidade de São Paulo, de complicações pós infarto que sofrera dias antes. Reconhecido na história do país como autor de mais de 350 capas produzidas desde a era dos elepês em vinil (suporte no qual ficaram mais conhecidos seus peculiares traços), Elifas Andreato também colaborou com vários jornais da imprensa alternativa de enfrentamento ao regime militar, que se estendeu entre 1964 e 1985.

Dias antes de precisar ser internado, Elifas ainda enviou, graciosamente, como era também de sua índole humanitária, uma de suas mais antigas ilustrações ao Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e Região, situada na Grande São Paulo, para ser capa do livro Rosca Sem Fim, publicação na qual a entidade denunciará o descaso histórico nas empresas do setor quanto às normas de prevenção e de indenização às vítimas de acidentes de trabalho. Ainda na área da música, recentemente Elifas criara o troféu e todos os elementos gráficos do Prêmio Grão de Música, iniciativa da cantora e compositora Socorro Lira (PB) que, já há oito anos, com o apoio de vários colaboradores, distingue revelações do cenário nacional, contemplando nomes de praticamente todos os estados nacionais.

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1513 – Renata Arruda (PB) lança disco com clássicos de sambas para comemorar 30 anos de carreira

A cantora e compositora paraibana Renata Arruda estreia na gravadora e produtora Kuarup com o lançamento de novo álbum com sambas clássicos e o inédito Foi Embora, de sua autoria, que segundo a artista, foi a maior dor de cotovelo que ela já compôs. Já com onze discos na carreira, este é o segundo disco do projeto Roda de Samba, lançado em 2013 a partir de repertório que Renata Arruda cantou em João Pessoa, Capital do Estado. O espetáculo deu tão certo que os músicos que a acompanham sugeriram registrar todas as canções apresentadas. Como os shows tinham mais de 25 canções e mais de duas horas de duração, parte do conteúdo entrou no primeiro trabalho e o restante ficou guardado para o lançamento de agora. As músicas foram escolhidas com o único critério: sambas que a cantora gosta de cantar.

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1122 – “O Banquete dos Mendigos”: disco duplo de Jards Macalé e um coletivo de artistas que peitaram a ditadura completa 45 anos

Bolachão foi gravado ao vivo na cidade do Rio de Janeiro,  em clima tenso, com tropas dentro e fora do MAM e ficou seis anos “recolhido” até finalmente ser lançado em 1979, intercalando músicas e os 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que, naquele dia, completava 25 anos

Com o blogue Criatura de Sebo e Jornal GGN

O Barulho d’água Música retoma a série Clássico do Mês para nesta mais nova atualização antecipar a comemoração do aniversário de 45 anos, que ocorrerá em 10 de dezembro, do álbum O Banquete dos Mendigos, gravado ao vivo, em 1973, no Museu de Arte Moderna (MAM), na cidade do Rio de Janeiro. E por que antecipar a matéria sobre este emblemático disco? Para recordar  nestes tempos em que há nuvens sombrias pairando sobre os valores e as instituições que promovem a democracia, o respeito e amor ao próximo, que o show que resultou na gravação do projeto dirigido por Jards Macalé comemorava, naquela ocasião, os 25 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas também tinha a função de chamar a atenção da população brasileira para a violação, em larga escala e sob aplicação de intensa violência, de direitos civis pelos militares que estavam no poder. Após a Comissão Nacional da Verdade, recentemente, entregar seu relatório oficial sobre as barbaridades cometidas em nome do Estado nos anos de chumbo, cobrou-se a punição aos crimes da ditadura, o fim de seus “entulhos” — resquícios como os “autos de resistência”, que ceifam a vida da juventude negra nas periferias do país, a perseguição às minorias que formam o segmento LGBT,  aos partidários de setores mais à esquerda do espectro político — que candidatos durante as mais recentes eleições voltaram a demonizar, atribuindo a adversários socialistas, por exemplo, pechas e rótulos que não só os desumanizam, como os transformam em “monstros”, trazendo das trevas, por exemplo, a ridícula crença de que “comunistas” são por si só homens maus e que estes “comem criancinhas”, como se dizia naquela época na qual as “fake news” já estavam por ai.   Continuar lendo

1507- Compositor e violeiro Paulo Freire leva canções e causos de Selva, seu mais recente livro, a Londrina (PR)

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Alô amigos e seguidores de Londrina, Bela Vista do Paraíso, Cambé, Sertanópolis, Alvorada do Sul, Ibiporã, Apucarana e cidades paranaenses próximas, vão ouvindo, vão ouvindo: na quinta-feira, 3 de março, o compositor e escritor Paulo Freire promoverá o lançamento do seu mais recente livro, Selva, no restaurante situado na Rua Espírito Santo, 655, no centro de Londrina. A cantoria, como sempre entremeada pelos causos recolhidos dos sertões brasileiros que apenas o violeiro de Campinas (SP) sabe como contar, está marcada para começar às 20h30 e terá a participação especial do multi instrumentista André Siqueira. As reservas deverão ser efetuadas por meio do número de telefone 43 99151-3587 com o máximo de antecipação, pois o estabelecimento limitou o número de mesas à disposição devido às restrições sanitárias de prevenção e combate ao coronavírus (Covid-19). “Tô muito feliz e animado em voltar à Londrina, encontrar os amigos queridos, e poder sapecar na violinha a trilha sonora e contar os causos do novo romance”, disse Freire.

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1489 – Brasil se despede de Monarco (RJ), joia do samba nacional e presidente de honra da Portela*

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*Do portal Carnavalesco, em https://www.carnavalesco.com.br/luto-no-samba-morre-monarco-presidente-de-honra-da-portela/

A cultura brasileira, o samba e o carnaval estão em luto profundo. Morreu no sábado, 11 de dezembro, Hildemar Diniz, o mestre Monarco, presidente de honra da Escola de Samba carioca Portela. O sambista estava internado desde 21 de outubro no hospital Cardoso Fontes, na cidade do Rio de Janeiro e precisou passar por uma cirurgia no intestino no início do mês de novembro. A causa da morte ainda não estava confirmada até a manha de domingo, 12 de dezembro, data do velório na quadra da Águia Altaneira.

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