
Edvaldo Santana cantou canções dele como Reserva da Alegria; Quem é que não quer ser feliz; Samba do Japonês; e Cara, Carol nos quartos do HMB. A assessoria de imprensa do hospital recebeu autorização por escrito dos pacientes para divulgação das imagens (Foto: Marcelino Lima/Acervo Barulho d’água Música)
O músico Edvaldo Santana (SP) demonstrou na sexta-feira, 16, que não é apenas um cantor e compositor dos mais admirados e talentosos entre os artistas independentes, mas que é também um homem fraterno, gentil e solidário. Na tarde daquele dia, intermediado pelo Barulho d’água Música, Edvaldo Santana esteve no Hospital Municipal de Barueri (HMB) onde percorreu leitos, corredores e o setor de hemodiálise, além da maternidade, local no qual entoou ao violão Cara Carol para os pais e a recém nascida Milene. Suas musicas e de autores como Elpídio dos Santos (Você vai gostar/Casinha Branca) e Adoniran Barbosa (Trem das Onze) despertaram sorrisos, derrubaram lágrimas e arrancaram muitos aplausos. Cara Carol, oferecida à Milene, ele compôs em homenagem ao nascimento da filha na época da Guerra do Golfo, travada no início da década dos anos 1990 entre Estados Unidos e Iraque.

Atitudes como a de Edvaldo Santana cantando para a paciente e irmã que a acompanha na convalescênça são dignas de aplausos e exemplo a ser seguido (Fotos acima, no destaque e abaixo: Vladimir Soares/Assessoria de Comunicação do HMB)

Barueri está situada a 26 quilômetros de São Paulo, lindeira à Rodovia Castello Branco (SP 280). Para cantar no HMB acompanhado pela esposa, Sueli, Edvaldo Santana partira pela manhã de São José do Rio Preto — dependendo do trajeto percorrido, a viagem exige deslocamento superior a 450 quilômetros até a Capital — e chegou pontualmente em relação ao horário assumido. O artista abriu mão de cachê, da cobertura da mídia e o que enobrece ainda mais seu gesto: superou a dor pelo luto da mãe, que sepultara no domingo anterior para honrar o compromisso voluntário com entusiasmo e carinho.
“Se a arte existir apenas para dar dinheiro e fama, não tem sentido, precisamos também colocá-la a serviço de quem precisa, sobretudo em momentos e em ambientes nos quais as pessoas se convalescem”, disse.
A trajetória de Edvaldo Santana é repleta de aventuras e de belas canções. Criado na Zona Leste de São Paulo e muito popular no efervescente bairro de São Miguel Paulista, o músico se destaca pela voz rouca e por um repertório que mescla variados ritmos do forró ao blues, do choro ao jazz. “Ações como essa, que levam alegria aos que estão acamados e em situação delicada, sempre devem ser apoiadas”, ressalvou.
Com mais de 40 anos de carreira nos quais gravou sete álbuns, celebrou parcerias com nomes como Ademir Assunção, Itamar Assumpção, Paulo Leminski, Tom Zé e Arnaldo Antunes. Nestas quatro décadas, constrói uma obra irretocável, sem fazer concessões sobretudo à mídia e preservando postura independente expressa em letras contundentes, mas também repleta de personagens populares, poesias e astral iluminado.
“Eu acredito muito na franqueza e na liberdade que me orienta, não há motivo para virar a mesa: se tem confiança não há violência”, canta Edvaldo Santana em uma das faixas de Jataí. Ainda curtindo o sucesso desta pérola do nosso cancioneiro, ele contou aos jornalistas Marcelino Lima e Vladimir Soares que no primeiro semestre de 2016 pretende lançar o oitavo álbum.
Vladimir Soares é jornalista dos mais tarimbados e corretos da região metropolitana Oeste da Grande São Paulo e atualmente responde pela Assessoria de Comunicação do HMB. A ação de humanização por meio da qual levou Edvaldo Santana é um projeto que o hospital pretende repetir de acordo com o interesse voluntário de artistas. Para colaborar e saber mais detalhes, o telefone de Vladimir Soares é (11) 9 7486-8268.
Quarenta anos na contramão e dizendo não ao ouro dos tolos*
* Texto publicado pela Rádio UOL, em 01/09/2014, dias depois de Edvaldo Santana se apresentar com sua banda na sala Adoniran Barbosa do Centro Cultural Vergueiro, em São Paulo
Por Marcelino Lima
Edvaldo Santana está chegando a 40 anos de carreira e embora neste tempo já tenha gravado inúmeros sucessos deixa a impressão que ainda canta e toca com a mesma disposição, alegria, contundência, irreverência e, no caso particularíssimo dele, simpatia de quem estaria empunhando o microfone e um violão pela primeira vez, estreando nos palcos disposto a conquistar cada pessoa da plateia. Se a frase “quanto mais velho o vinho…” para ele se encaixa, a obra de sete discos deste bardo filhos de nordestinos que baixou lá em São Miguel Paulista e neste lendário, efervescente e mágico bairro-cidade da Zona Leste (ZL) paulistana cresceu andando na contramão estabelece, ainda, outra constatação: quanto mais o cara amadurece, mais parece que se renova e, assim, e remoçando-se, deixa para o público que o cultua a marca perene de um trabalho que prima pela qualidade e pela verdade, pelo engajamento e pela inteligência crítica. Só alguém que desde pivete tem posicionamento, ideias, suingue, poética e um anjo da guarda barroco poderia colocar se serviço da cultura que é (do) contra o ouro dos tolos, dos que adoram jabaculês e paparicos do jet-set.
Senhora contribuição ao país, sim senhor, digna de ser objeto de teses de mestrado e receber espaços mais generosos em cadernos B, os quais normalmente se gabam de serem antenados e reverenciarem os “malditos”! Os xotes, baiões, sambas, raps, hip-hops, baladas ou blues urbanos-agrestes deste guerrilheiro retratam com fidelidade — portanto sem retoques, sem maneirismos ou manérismos –, por exemplo, a periferia dos grandes centros e seu povo mais para crioulo e caboclo do que para loiro. Gente que rala em vagões lotados de trens sucateados, joga bola e resolve o jogo, trampa de pedreiro (até morrer, se preciso for, ou não tiver jeito), desvia de foguetes e de balas atiradas a esmo, corre dos gambés, suporta todo tipo de opressão andando de lado e fingindo-se de morto e, quando não tem a sorte de sair da linha de tiro, sequer uma testemunha ou caixão consegue; revelam manos de carne, dente, osso e unha — aliás, com mais osso do que carne, com dentes e unhas de menos –, mas que no dia a dia insistem em seguir avante, sorrindo, banguelas, fazendo churrasco na laje, descolando uma mina nova, tomando uns tragos aqui e acolá por que ninguém é de ferro — e nem sempre o santo ajuda! E vamos arrematando um novo cordel, rimando caldo de cana com um pastel de japonês: afinal, quem é que não quer ser feliz ou não merece um copo de vermute?
Como se não bastasse a bandeira empunhada em defesa desta massa, a música de Edvaldo Santana é antipanfletária e anti(pros)elitista, não troca passes com chavões banais. “Jataí”, por exemplo, é um mapa das riquezas do Brasil e dos seus vários tipos humanos, do Oiapoque ao Piauí. Este blog por todas estas características já escreveu sobre ele mais de uma vez, em todas deixando claro que no nosso barco ES navegará sempre na proa — e na janelinha! O tiozinho que saiu de sua cadeira e pediu humildemente para a plateia reverenciar e aplaudir o “Lobo Solitário” antes mesmo dos acordes finais da música de despedida que Edvaldo Santana e sua banda* executavam no domingo, 24 de agosto, no Centro Cultural Vergueiro, em São Paulo -– e, não contente, subiu no palco para cumprimentá-lo com a música ainda em andamento –, é um dos admiradores que sabem: o cantor e compositor merece que por ele tiremos o chapéu!

Durante a maior parte da apresentação, Edvaldo Santana, aliás, usava óculos de lentes escuras. Tirou-os apenas na hora de pegar um papel para ler nomes das pessoas as quais deveria agradecer, do técnico de som ao responsável pela Sala Adoniran Barbosa. Alguém poderia até pensar que o adereço das lentes seria um disfarce de alguém supostamente marrento, quem sabe parte da fantasia de uma mera personagem. Mas como poderia ser esnobe ou entrar em cena mascarado um camarada que é o que é, e estando no centro das atenções no calor daquele momento, despiu-se do papel de astro e brincou o tempo todo com quem o curtia, contou sem delongas ou autocensura de onde veio e alguns hábitos, várias vezes bateu as palmas para seus músicos, ergueu-as para os céus agradecendo aos parceiros de estrada que com ele contribuíram nestas quatro décadas — entre os quais Paulo Leminski, Itamar Assumpção, Ademir Assunção e Luiz Waack?
“Estes caras e muitos outros que já passaram para outro plano ou ainda estão por aqui sempre me ajudaram muito, foram me moldando, me deram conselhos fundamentais no começo da minha carreira, me orientaram direitinho e muitas vezes com sua sabedoria até me recomendaram segurar um pouco minha onda”, disse Edvaldo Santana. Ele pediu aplausos para um destes mestres, o poeta-samurai polaco-curitibano que não discutia com o destino. E não se esqueceu de jogar uma rosa também para “seu Valdemar”, amigo da ZL cuja especialidade é podar flores e livrar-se adequadamente dos espinhos para não furar dedo de menininhos. Com estas palavras, Edvaldo Santana revelou que a gratidão é outra de suas marcas. Eis, portanto, mais que um artista, um homem elegante que nos descarrega do peso de algumas dores. Se você trombar com ele por ai, diga que mandamos um forte abraço e que estamos indo pela mesma trilha!

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